Assassinos silenciosos de culturas organizacionais

Todos temos preconceitos inconscientes. E combatê-los é um trabalho tanto individual como colectivo. Só elevá-los a um nível consciente levará à definição, gestão e manutenção das soluções necessárias que criarão mudanças reais.

Por Marco Neves, managing partner da Next Neuro Generation leader, autor, palestrante e coach executivo

 

Navegam pelos gabinetes, escritórios, salas de reuniões, open spaces e pelos meandros dos corredores. Silenciosos, mas poderosos, atacam de forma fulminante, minando terrenos e manipulando comportamentos e hábitos. Alienam pessoas que se sentem menosprezadas, criam desconfiança e inibem a comunicação aberta. Fazem das ideias e soluções reféns, põem em causa os resultados das equipas. Levam a decisões de má qualidade e prejudicam a construção de relacionamentos duradouros. Na sua essência, desmoronam culturas organizacionais.

Estamos a falar dos “preconceitos inconscientes”, inimigos perigosos e de difícil aceitação, especialmente por aqueles que se consideram imparciais, que provavelmente (e infelizmente) representam uma percentagem significativa dos indivíduos nas organizações.

Em todas as suas formas, muitas vezes carregando uma conotação negativa, são facilmente vistos como uma escolha deliberada e não como uma predisposição não intencional. No entanto, pesquisas indicam que temos uma predisposição inconsciente para preconceitos, porque o cérebro tem uma necessidade evolutiva de o fazer.

É um processo que resulta de décadas de programação mental do cérebro, na tentativa de fazer sentido do mundo e das pessoas que o rodeiam. Esta aprendizagem tem início na infância e no início da idade adulta, pela convivência com pais, professores, colegas, ou pela influência de variados contextos sociais e emocionais. Estes preconceitos dominam as decisões, a conduta e as interacções, governando os nossos hábitos, pensamentos e comportamentos.

No local de trabalho, a cultura organizacional alimenta directamente este processo no cérebro, levando à criação de preconceitos e à adopção de crenças estereotipadas e comportamentos sociais que se consolidam no tempo. O afastamento destas normas torna-se difícil, porque é percebido pelo cérebro como uma mudança que nos afastará da nossa zona de conforto e da necessidade de sentir parte do colectivo.

Acções tendenciosas, como categorizar e rotular pessoas e situações, são a forma de o cérebro acelerar o processo de tomada de decisão, fazendo suposições rápidas sobre quem confiar, como se comportar, o que dizer – essencialmente garantindo a nossa sobrevivência.

Evolutivamente, os preconceitos inconscientes são mecanismos adaptativos e poderosos, baseados no conhecimento e experiência anteriores, para informar as decisões e acções no presente, estabelecendo expectativas sobre o que vemos, ouvimos e sentimos. E uma vez gerada e enraizada essa expectativa, persiste com pouca deliberação ou reconsideração – temos dificuldade em ver, ouvir ou sentir de outra forma!

Independentemente de como os preconceitos regem o comportamento (uma vez que ocorrem fora do espectro de pensamentos, guiados pelo contexto, e realizados sem pensamento consciente), somos incapazes de saber quão predominantes e influentes estes são. Os preconceitos são, na realidade, uma parte inevitável do ser humano.

 

O cérebro e o preconceito
Cientistas investigam há muito a base neural dos preconceitos inconscientes, para entender como estes formam e influenciam hábitos, comportamentos e culturas, e como podem ser geridos e regulados.

O “painel de controlo de preconceitos”, composto por cinco sistemas cerebrais que trabalham em sintonia, é apresentado na imagem 1. É uma representação simplificada dos processos complexos sustentados por redes de estruturas neurais em múltiplas regiões do cérebro.

Poderemos considerar os preconceitos inconscientes como a identificação de padrões, executada numa fracção de segundo, levando a reacções imediatas, imprudentes e defensivas em relação a outros. Esta “competência”, que tem sido fundamental para a sobrevivência e evolução humana, é o resultado dos sistemas de análise de risco, de hábitos e de recompensa trabalhando em uníssono, tirando conclusões baseadas em informações preliminares.

Os sistemas executivos e de aprendizagem, embora capazes de testar conceitos, analisar complexidades, articular julgamentos e fazer escolhas, dadas as suas fragilidades e funcionamento subóptimo em determinados cenários, muitas vezes endossam ou racionalizam conceitos, ideias e sentimentos que foram gerados pelos sistemas de análise de risco, de hábitos e de recompensa, levando ao mau funcionamento e comprometimento do pensamento de ordem superior.

Leva assim o cérebro a preparar o terreno para a estereotipagem, a categorização social, os preconceitos, a desigualdade e os conflitos intergrupais, enfim, para a derrocada silenciosa de culturas organizacionais!

 

O impacto real do preconceito nas organizações
Esta tendência de o nosso cérebro fazer julgamentos rápidos e suposições que nem sempre são precisas sobre outras pessoas tem um impacto significativo e nefasto no mundo real. Nem sempre é possível confiar no cérebro, pois as armadilhas cerebrais e atalhos podem, por vezes, desviar-nos do nosso caminho.

Infelizmente, no nosso mundo, um número esmagador de preconceitos afecta o nosso pensamento todos os dias, tanto pessoal como profissionalmente. Quando não controlados, os preconceitos levam indivíduos e equipas a estados a que os cientistas chamam “away state” (afastamento), afectando a produtividade, o sentimento de pertença, as taxas de retenção, a contratação, o feedback e a gestão das equipas, entre muitos outros impactos negativos.

Felizmente, vários estudos indicam claramente que a plasticidade do cérebro humano permite moldar os comportamentos, aumentando a capacidade da auto-regulação das faíscas inconscientes dos preconceitos e da gestão dos preconceitos que são os mais comuns no local de trabalho.

 

Leia o artigo na íntegra na edição de Janeiro (nº. 157) da Human Resources, nas bancas.

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