De que forma devem as organizações lidar com os colaboradores que estão de luto?

A pandemia da COVID-19 tornou a morte um assunto inevitável. Mas morte e luto são temas que têm uma certa rejeição por parte das pessoas, inclusive dentro das empresas.

 

Por não debaterem o tema de forma pragmática, muitas vezes as organizações não estão preparadas para lidar com esta situação quando surge um caso, sobretudo agora em situação de pandemia, culminando em acções inadequadas ou na omissão, deixando de dar o devido apoio, minimizando os danos e não expressando apreço e gratidão aos que partiram.

Por definição, o luto é um processo natural desencadeado pelo rompimento de um vínculo. A morte é a perda mais óbvia e directamente associada ao sentimento, mas não é a única. Divórcio, reforma e despedimento, por exemplo, também representam quebras de laços e podem gerar processos de luto profundo, dependendo da situação individual. Com a pandemia, estamos a viver um luto colectivo. «Além de mortes em maior número, há a sensação de falência do mundo como conhecíamos até agora e uma sobreposição de outras perdas, como a financeira, da liberdade, do convívio social, e a interrupção de planos e projectos», explica a psicóloga Mariana Clark, especialista em luto.

Falar de morte é algo que as pessoas costumam evitar. Ninguém se sente confortável num velório nem sabe muito bem o que dizer a alguém que tenha acabado de perder um ente querido, por muito que a relação seja de consideração e afecto. No contexto do trabalho, o tabu também existe. «As organizações são locais onde muitas vezes as pessoas não têm espaço para demonstrar emoções e vulnerabilidade. Mesmo na situação de falecimento de um parente, o profissional tem medo de que a fragilidade seja interpretada como fraqueza e incapacidade de continuar a produzi», diz o psicólogo Bernardo Leite Moreira.

De acordo com a pesquisa “Melhores Práticas para lidar com o Luto no Ambiente Profissional” realizada em 2019 e que contou com a participação de 315 organizações, sendo os participantes profissionais dessas organizações, em especial da área de Recursos Humanos e Gestores de Pessoas, quase metade dos que responderam (44,4%) apontou uma percepção indiferente ou negativa das acções da empresa diante dos últimos eventos de luto ocorridos internamente.

O apoio psicológico e as homenagens prestadas, apesar de serem as acções de menor presença na oferta de benefícios (9,2% e 6,3% respectivamente), estiveram presentes em 76% das avaliações positivas em relação à forma como a gestão lida com o luto.

De acordo com Bernardo Leite Moreira, a forma como a empresa administra situações de luto tem enorme importância nas questões de clima da organização, nível de envolvimento, orgulho e pertença e, inevitavelmente, no índice de produtividade do negócio. “Evidentemente esta é uma preocupação importante para a área de Recursos Humanos”, refere.

Esse olhar atento sobre o tema deve ser independente do actual momento de pandemia que o mundo atravessa. Mas será que as empresas estão a fazer um trabalho proactivo junto dos colaboradores, na tentativa de perceber se eles estão a viver alguma situação de luto? Há muitos profissionais em home office e que podem estar sozinhos. Será que os Recursos Humanos e a gestão da organização estão a olhar por essas pessoas? Existem redes de apoio?

Ao longo da pandemia, os especialistas frequentemente deparam-se com as perguntas “como faço para não demonstrar o meu sentimento?” ou “como faço para que a minha equipa não perceba o que estou a sentir?”. Ainda existe a ideia de unir o lado da fragilidade e da vulnerabilidade com a manutenção de ser produtivo.

Os especialistas defendem que as organizações não podem sair desta pandemia sem nenhum tipo de transformação. É uma obrigação social as empresas lideram com o tema e começarem a inclui-lo nas suas preocupações. «As pessoas não estão a viver o luto de uma forma normal e isso interfere na organização, pelo que o assunto é fundamental», defendem os especialistas.

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