(des)Igualdade entre homens e mulheres em tempos de crise…

Opinião de Sandra Ribeiro

Presidente da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego

Uma análise sob a perspectiva do género é fundamental para compreender a profundidade e os efeitos da actual crise económica e para desenhar as respostas de recuperação mais adequadas. A crise afectou e afecta homens e mulheres, mas afecta-os de maneira diferente.

Um recente relatório das Nações Unidas demonstra que se no início da crise foram os homens quem mais perderam postos de trabalho, entretanto, têm sido as mulheres quem mais estão expostas a situações de desemprego. Efectivamente, as mulheres, neste momento, são quem perde mais e mais rapidamente empregos, enquanto os homens apresentam uma ténue tendência de estabilização da taxa de desemprego. Quando a crise financeira se abateu inicialmente nos Estados Unidos e a seguir na Europa, as consequências fizeram-se sentir primeiro nos sectores com mão de obra masculinizada, como a construção e indústria extractiva e só mais tarde atacou sectores tradicionalmente femininos como os serviços e a industria manufactureira, nomeadamente os têxteis. A situação, passados três anos inverteu-se claramente. No terceiro trimestre deste ano, em Portugal, a taxa de desemprego dos homens atingiu os 12%, mas a das mulheres ultrapassou largamente este valor e fixou-se em 12.9%.

A desigualdade entre homens e mulheres no trabalho não é um fenómeno novo, mas a actual crise económica tem vindo a aumentar os factores de desigualdade de género em todo o mundo. Não há dúvida de que as mulheres estão particularmente em desvantagem para lidar com a crise financeira. A sua falta de poder político e económico, consequência da sobre representatividade em empregos precários ou temporários, salários mais baixos, e o facto de serem os principais provedores do cuidado dos filhos e dos dependentes, torna-as obviamente o elo mais fraco. Por tudo isto, é previsível que sejam as mulheres a ficar ainda mais em desvantagem na recessão económica. Mas por outro lado, é preciso lembrar que esta crise é diferente de outras que aconteceram em momentos anteriores da nossa história recente, porque hoje em dia, o trabalho das mulheres, por mais precário e mal pago que possa ser é indispensável para o seu sustento e para o sustento os seus lares. O trabalho das mulheres é fundamental para a economia de qualquer país. Por isso, o afastamento das mulheres do mercado de trabalho não é uma hipótese minimamente ponderável, nem para as próprias, nem para o mercado de trabalho, nem para o sistema de segurança social nem para o sistema fiscal.

As mulheres não vão desistir do seu lugar no mercado de trabalho, nem o mercado de trabalho quer prescindir da sua força e competência laboral, mais do que provada em todos os sectores de actividade, nem o sistema contributivo ou tributário quer perder a sua comparticipação. Precisamos pois, de não perder algum optimismo e pensar que a actual situação de crise também poderá oferecer uma grande oportunidade de mudança. Mudar, por exemplo, a arquitectura do sistema financeiro global tornando-o mais atento à igualdade. Mudar, por exemplo, para um modelo macroeconómico de desenvolvimento em que a igualdade de género seja uma parte integrante. Mudar, por exemplo, a forma rígida dos papéis sociais atribuídos aos homens e às mulheres. Mudar os preconceitos.

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