Dois caminhos para o futuro: imaginação e accountability

Opinião de Miguel Pina e Cunha

Nova School of Business and Economics e conselheiro da revista HR Portugal

Os discursos que nós portugueses produzimos sobre Portugal parecem por vezes exercícios de masoquismo. O discurso as autoflagelação por si só não leva longe.

Como tal, sigo outro caminho, apresentando possibilidades alternativas: um desejo e uma realidade.

1. Um desejo chamado accountability. Costumamos dizer que por cá a culpa morre solteira. Pode ser verdade em demasiados casos – particularmente na nossa justiça de caracol. Mas, nas empresas, passemos do discurso da culpa para o da responsabilidade. O objectivo não é tanto ou sobretudo o de identificar o culpado e de lhe apontar o dedo, mas o de usar a responsabilidade e a prestação de contas como exercício de desenvolvimento. Uma das explicações para a irresponsabilidade colectiva radica na falta de responsabilidade individual. Quando a responsabilidade é de todos não é de ninguém. Há meses, ao entrar num avião da TAP, um dos técnicos de operação aeroportuária dizia via walkie talkie que “Já passei essa questão. Isso não é problema meu”. Eis o que me pareceu uma boa metáfora de Portugal: um País onde passamos os problemas uns aos outros para não termos que os resolver. Uma outra via para os gestores de pessoas explorarem: uma empresa multinacional de serviços aplicou uma regra, também em Portugal, que estabelecia que quando alguém identifica um problema esse problema também passa a ser seu. E só deixa de o ser quando for resolvido. Parece elementar: um problema da minha organização é um problema meu. Quem instituir esta cultura muda o que Sumantra Ghoshal chamada de cheiro do lugar.

2. Uma realidade. Mas não temos tudo a aprender com os outros. Martin Wolf, famoso jornalista do Financial Times, foi a mais recente de muitas personalidades a mencionar a lei portuguesa de descriminalização do consumo de droga. Portugal foi o primeiro país da Europa a passar esta lei, que não provocou nenhum problema de maior e ajudou a lidar com o flagelo da heroína. Aos nossos compatriotas que resolveram corajosamente combater hábitos e preconceitos, devemos esta vitória que, agora, é de todos. Mas, ganha esta guerra, fica a moral da história. Podemos e somos capazes de andarà frente. Neste caso andámos; noutros podemos também vir a andar. O importante é que sejamos imaginativos e ousados nas soluções.

3. Portugal não está condenado a ser um backwater da Europa. Mas tem que combater os seus próprios vícios como o do jogo do passa-a-outro-e-não-ao-mesmo com responsabilidade e imaginação.

4. Os gestores de Recursos Humanos podem aqui desempenhar um papel crítico, através da criação de espaços organizacionais psicologicamente seguros mas plenos de accountability, nos quais errar honestamente e assumir o erro para aprender com ele é mais valorizado, reconhecido e apreciado do que não cometer nenhum erroporque nunca sequer se tentou.

5. As pistas para explorar a noção de segurança psicológica podem ser procuradas no trabalho de Amy Edmondson, professora na Harvard Business School e autora de livro The Learning Challenge.

6. A alternativa, porque estas coisas dão muito trabalho, é fazer como o homem do walkie talkie: assumir que problema passado é problema resolvido e andar com a vidinha para a frente.

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