Faltam medidas no PRR para combater o desemprego jovem em Portugal

Apesar de os jovens portugueses estarem mais expostos ao desemprego do que os seus congéneres europeus, não há medidas no pilar 6 do Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR) – focado em políticas para a próxima geração – orientadas para o emprego jovem em Portugal. Todas as 16 propostas do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) português para promover o emprego jovem são direccionadas para a educação.

 

Faltam por isso incentivos de combate ao desemprego, como apoios dirigidos às empresas, programas que facilitem a procura de emprego e a reformulação de serviços como o Instituto de Emprego e Formação Profissional.

Estas são conclusões do relatório “School to Work Transition in the Resilience and Recovery Facility Framework”, elaborado por Francisco Simões, investigador do ISCTE– Instituto Universitário de Lisboa, para a Comissão dos Assuntos Económicos e Financeiros do Parlamento Europeu. A análise tem como objectivo apurar a implementação do MRR ao nível das políticas de emprego dirigidas aos jovens e europeus e será discutido pelos eurodeputados da comissão nos próximos meses.

A investigação envolveu a recolha e comparação de quatro indicadores quantitativos de educação e emprego europeus, de 2012 a 2021, e uma análise qualitativa dos PRR de seis países do Sul da Europa: Chipre, Espanha, Grécia, Itália, Malta e Portugal.

«Há um forte investimento no sector da educação, mas faltam políticas públicas de combate ao desemprego jovem», afirma Francisco Simões. Das medidas analisadas, apenas 11% do investimento dos PRR destes países é destinado a apoiar o emprego jovem. Os restantes 89% dedicam-se à educação, sendo 75% das verbas destinadas aos ensinos profissional, secundário e superior, e 14% destinadas a melhorar o ensino pré-escolar.

As medidas analisadas focam-se, sobretudo, na formação de professores, na criação de novos cursos superiores e na aposta na digitalização das instituições, incluindo as infraestruturas.

«Nas últimas décadas, apesar dos elevados investimentos na qualificação da população portuguesa terem resultado em avanços notáveis nos níveis de escolaridade e competências das novas gerações, o emprego jovem continua a ser de baixa qualidade e particularmente afectado pelas crises económicas», afirma Francisco Simões.

Dados estatísticos analisados revelam que, nos últimos dez anos, mais 15,9% dos portugueses entre os 30 e 34 anos obteve um diploma universitário. No entanto, o desemprego jovem em Portugal continua a ser 3,5 vezes superior ao desemprego total, afectando sobretudo aqueles com idade inferior a 25 anos.

O investigador considera ser necessário adequar a oferta formativa às necessidades do mercado de trabalho em Portugal: «O investimento na educação é fundamental, mas há que criar condições para que o mercado possa acompanhar o aumento do número de graduados do ensino superior», afirma Francisco Simões.

Outra conclusão do estudo é que a maior parte das medidas são universais e não avaliam as necessidades de grupos específicos de desempregados, nomeadamente dos jovens. Os seis PRR analisados contemplam 98 medidas de incentivo ao emprego, das quais 63 se referem ao desemprego geral. No caso português, só três das 16 medidas analisadas são orientadas para os jovens, ainda que as mesmas sejam de cariz educativo.

Os investimentos para o emprego jovem não vão ao encontro das necessidades das diferentes áreas territoriais dos seis países em análise. Em Portugal, a maior taxa de jovens “Nem em Emprego, Nem em Educação ou Formação” (NEEF) registou-se, em 2021, nas ilhas dos Açores. Também o arquipélago da Madeira e a região do Algarve apresentaram taxas elevadas de jovens NEEF, ao contrário da área metropolitana de Lisboa, onde se registou a percentagem mais baixa.

No entanto, medidas como a criação de estágios ou apoios à contratação são implementadas, sobretudo, em áreas urbanas. Exemplo disso é o programa de “Apoio às comunidades desfavorecidas nas Áreas Metropolitanas”, iniciativa a implementar no Porto e em Lisboa com o objectivo de combater as vulnerabilidades destes territórios e dos seus residentes.

Mais benefícios fiscais para empresas que empreguem jovens desempregados e uma maior adaptação dos serviços de emprego às características locais são soluções apontadas por Francisco Simões: «Em zonas mais remotas a distância entre os centros de emprego e os jovens é maior e as redes de transportes são piores, abrindo caminho para a aposta na digitalização destes serviços», afirma o investigador. A descentralização – com serviços de emprego itinerantes nas várias localidades de um concelho do interior – será também uma forma de combater o desemprego jovem nestes locais.

A distância entre as qualificações e os salários são preocupações reveladas pelo investigador. O bem-estar dos trabalhadores e o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional são, igualmente, desconsiderados no PRR: «Nunca como hoje se discutiu tanto o tema da saúde mental. Por essa razão, seria importante implementar medidas que assegurem o bem-estar dos jovens no local de trabalho, tanto a nível psicológico como material».

Entre as 98 medidas analisadas nos seis países, apenas uma em Itália é dedicada ao conforto material dos jovens, prevendo a atribuição de apoios financeiros e de bolsas de apoio à habitação aos estudantes.

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