Afinal, a IA pode levar os profissionais a trabalhar mais horas

As opiniões sobre a Inteligência Artificial (IA) dividem-se. Muitos especialistas acreditam que pode contribuir para a adopção da semana de trabalho de quatro dias, mas outros alegam que a IA poderá, na verdade, aumentar as exigências dos profissionais à medida que as empresas começarem a funcionar 24 horas por dia, noticia o Business Insider.

 

Binny Gill, fundador e CEO da Kognitos, uma empresa que utiliza Inteligência Artificial Generativa (IA Gen) para automatizar processos de negócios, trabalha quase todos os dias e também aos fins-de-semana. E, à medida que a IA se vai enraizando no local de trabalho, acha que mais empreendedores vão sentir-se pressionados a fazer o mesmo.

Grande parte da conversa sobre como a IA pode reescrever o trabalho de cada função gira em torno da ideia de que bots assumirão as tarefas mais aborrecidas e isso libertará o profissional para o trabalho de maior criatividade e concentração, tornando mais fácil transitar para uma semana de trabalho de quatro dias.

No entanto, Binny Gill vê outra possibilidade: a IA poderá impulsionar uma cultura “sempre disponível” e pressionar pelo menos alguns profissionais a trabalhar mais, e não menos. «As empresas vão usar a IA apenas para se manterem no activo – fazer com que a IA tome decisões para as quais os humanos são necessários – e vão transformar-se em máquinas 24 horas por dia, 7 dias por semana», explica ao Business Insider. «Os humanos farão menos trabalho manual sim, mas por outro lado terão de estar sempre “de plantão”, porque as empresas não vão parar, por causa da concorrência.»

Se os trabalhadores precisarem de supervisionar os bots de IA a toda a hora, nem todos poderão trabalhar os quatro dias por semana, argumenta Binny Gill, e esses ficarão cada vez mais ocupados e cansados.

Uma faca de dois gumes

Nem todos acham que a IA vai acabar com o sonho de uma semana de trabalho de quatro dias. Emily Rose McRae, analista sénior da Gartner, espera que a ideia passe de “radical a rotineira”, até porque vai ser difícil as empresas justificarem as despesas extras de funcionamento 24 horas por dia. E acrescenta que muitas empresas reduziram, nos últimos anos, o nível de serviço que antes ofereciam porque os colaboradores estão sobrecarregados e exigem melhores condições.

Além disso, trabalhar 24 horas por dia, 7 dias por semana, implica mais trabalhadores, e «basicamente não temos pessoal suficiente na força de trabalho», garante McRae.

Simon Johnson, professor de economia e gestão no Massachusetts Institute of Technology e ex-economista do Fundo Monetário Internacional, reitera que muitos profissionais já se sentem pressionados a trabalhar horas extras. «Não vejo como a IA vai ajudar nisso.»

Ainda assim, espera que a semana de trabalho de quatro dias se concretize. Quando se trata de IA, considera que a grande questão é que novas tarefas poderá a tecnologia criar nos próximos cinco a 10 anos que ainda não conseguimos prever. A resposta pode ajudar a moldar essas semanas.

«Poderá haver mais pressão para trabalhar», refere mas também poderá libertar as pessoas para se concentrarem em actividades mais criativas no trabalho ou no seu próprio tempo. Para já, os ganhos de produtividade para as tarefas existentes que a IA pode realizar não são grandes, garante Johnson.

E alerta que se a tecnologia não gerar mais coisas para os profissionais fazerem, poderá deixar as pessoas sem trabalho, criando maior concorrência nos empregos que se mantêm.

Para Alexey Korotich, vice-presidente da Wrike, uma plataforma de gestão de trabalho, uma vez que a IA dará aos trabalhadores acesso, em tempo real, às informações sempre que desejarem, pode ser mais difícil para alguns profissionais “desligarem”.

E exemplifica com o correio electrónico. «O e-mail tornou as empresas mais eficientes, mas depois criou outro problema. É tão rápido, fácil e barato enviar e-mails que agora a humanidade tem dificuldade em responder a todos eles.»

O papel da administração

Mesmo que a IA permita que muitos trabalhem menos, será importante que os líderes também o façam, defende Dale Whelehan, CEO da 4 Day Week Global, uma organização sem fins lucrativos.

Caso contrário, os profissionais que ambicionam ascender na carreira sentir-se-ão pressionados a espelhar esse comportamento e a trabalhar mais. Whelehan afirma que, em última análise, será a administração a decidir se a IA levará à perda de empregos ou permitirá uma semana de trabalho de quatro dias.

«No início dos anos 2000, a tecnologia era a grande esperança. Ia levar a enormes perdas de empregos e foi exactamente o contrário. Criou empregos e inovação, mas não contribuiu muito para haver um maior equilíbrio entre vida pessoal e profissional», recorda.

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