Felicidade e Empresa

Por Isabel Moisés, directora executiva de Recursos Humanos do Grupo Secil

 

Desde 2007 que reflito sobre como trazer o tema felicidade para dentro das organizações. O assunto surgiu-me pela primeira vez ao constatar que os níveis de stress organizacional não paravam de aumentar, com consequências negativas na produtividade e na saúde dos Colaboradores. Hoje, passados quase 15 anos, o tema do wellbeing está para ficar nas agendas de quase todas as empresas, das maiores às mais pequenas, das nacionais às multinacionais.

No entanto, a realidade demonstra ainda que existe um longo caminho a percorrer para que seja um tema completamente entendido e bem gerido.

Senão vejamos, o debate da separação da vida pessoal e profissional começa a parecer cada vez mais complexo. As jornadas de trabalho são cada vez maiores nos chamados profissionais do conhecimento e as tecnologias que nos mantêm ligados à empresa e ao trabalho tornam um tanto absurda a retórica sobre o tempo pessoal e o tempo profissional. O trabalho remoto, mesmo que somente a partir de casa nestes tempos de pandemia, está agora ao alcance de muitas mais pessoas, pelo que a discussão da vida pessoal e da vida profissional parece uma falácia, a menos que assumamos como normal ter de dividir a identidade em dois. O que é cada vez menos possível e aceitável, porque na verdade o grande desafio das pessoas é o de sentirem-se completas e não divididas.

Então, se o grande desafio das empresas é proporcionar ambientes organizacionais que sejam mais permeáveis e acolhedores a todos os interesses e dimensões da vida dos seus colaboradores, ou dito de outra forma, que permitam que cada pessoa encontre algum alinhamento entre o seu propósito individual e o propósito empresarial,  onde fica a questão  atual da necessidade de desligar do trabalho? Considerada um requisito de bem-estar e saúde mental? Sabemos que o stress de casa vai para o trabalho, e o stress do trabalho vai para casa. Na verdade, a situação tem vindo a piorar, ou ficou mais complexa, precisamente porque essas fronteiras são cada mais difíceis de distinguir.

Julgo que o dilema para as empresas e para os indivíduos é como conjugar o verbo de viver em plenitude com o verbo de “desligar é preciso”?  E  na perspetiva das empresas, claramente que não há conhecimento nem experiência suficientes para gerir qualquer destas variáveis. Abordando apenas um dos lados da equação, se “mal compararmos” a vida de uma pessoa a uma pizza, as empresas olham e procuram gerir uma só fatia da vida dos seus colaboradores porque não estão vocacionadas para entender e gerir as restantes. Chamo a isto desperdício. É como se comprássemos uma pizza, comessemos uma fatia, esquecessemos o resto no forno e, passados uns dias, deitássemos o resto no lixo porque ficou duro e com bolor. Enfim, a imagem de deitar no lixo a maioria das fatias da pizza quando ficam velhas até pode ser um bocado agressiva e talvez exagerada, mas ajuda a perceber o tanto que deixamos de lado, quando nos limitamos a pegar só o lado profissional das pessoas.

Ler Mais