Filipa Martins, Edenred: Um tema de representatividade democrática e inclusão

Filipa Martins, CEO da Edenred Portugal acredita que «a importância da diversidade de género nos cargos de liderança é, essencialmente, um tema de representatividade democrática e inclusão». Leia o seu testemunho.

 

«A importância da diversidade de género nos cargos de liderança é, essencialmente, um tema de representatividade democrática e inclusão. Trata-se de garantir que o grupo responsável pela tomada de decisões é representativo da sociedade ou do conjunto de trabalhadores e clientes das empresas afectadas por essas decisões. Por isso é tão importante que essa representatividade de género (ou outra) se faça sentir ao nível da liderança das empresas e de todas as instituições que regulam a sociedade, quer pela igualdade de oportunidades, quer pelo facto de estar provado que boards diversificados geram melhores resultados para o negócio e para a sociedade.

Não considero que um sector seja mais masculino do que outro, simplesmente, alguns estão mais atrasados neste processo de equilíbrio e de igualdade de oportunidades. Um exemplo muito actual da criticidade de perfis equilibrados são os ensaios desenvolvidos no domínio da inteligência artificial, aplicada a processos de tomada de decisão no âmbito legal. Se os programadores não forem realmente diversos (não só em género), corremos o risco de ter algoritmos que sugerem decisões desequilibradas, tendenciosas e até pouco éticas.

A liderança em si, acredito que tenha alguns traços vincados pelo género, com o estereótipo global de que homens são mais competitivos e mulheres mais colaborativas, mas não acho que se deva generalizar. Depende, sem dúvida, da personalidade de cada um e da sua competência para o cargo. Na verdade, é esta a razão pela qual a meritocracia deve sempre imperar.

No meu caso pessoal, sempre vivido em Portugal, nunca senti nenhum caso de discriminação por género, antes pelo contrário. Todo o sistema de ensino nacional até à universidade promove igualdade total de oportunidades, e na minha actividade profissional sempre vivi em ambientes meritocratas de promoção de talento.

Uma curiosidade, as duas vezes em que fui mãe coincidiram com momentos de promoção a cargos de direcção e maior exigência profissional. Foram desafios que pude aceitar, dada a rede de suporte familiar que me apoiou, permitindo que a logística em casa fosse compatível com a maior exigência das funções que assumi no trabalho. Mas é este também o ponto que considero verdadeiramente desacelerador das carreiras femininas em Portugal: a fase da maternidade. Sobretudo porque, aqui sim, se sente o desequilíbrio real de oportunidades, não só para as mulheres como para as entidades empregadoras.

É imperativo igualar, com regime de obrigatoriedade, os períodos de licença de maternidade e paternidade, para que realmente seja indiferente para o empregador contratar homens ou mulheres, e para que aos homens que assim o pretenderem seja dada a oportunidade efectiva de participar activamente nos primeiros meses de vida de um filho.

Só nas gerações dos 40 ou 30 anos, e as que se seguem, se começou parcialmente a sentir este efeito, com a consequente participação dos homens numa paternidade mais activa aquando do nascimento. Um bom exemplo deste tipo de medidas é a recente deliberação de pagamento a 100% de teletrabalho, caso haja alternância do cuidado a filhos até ao final do primeiro ciclo, durante o presente período de confinamento.

É precisamente este desequilíbrio que tem travado a progressão profissional de mulheres em gerações anteriores, que até gostariam de progredir, mas que não tiveram um sistema de apoio que o permitisse, que sou a favor da lei da quotas. É uma lei que só faz sentido como acelerador do equilíbrio e igualdade nos cargos de liderança, para que depois haja autorregulação da promoção de talento feminino e masculino nesses boards.

Numa fase em que muitos boards são ainda 100% masculinos, é preciso forçar um pouco a mudança, recorrendo ao talento feminino já disponível, para que este equilíbrio se torne natural. No futuro, o ideal é que não haja necessidade de falar de líderes femininas, mas apenas de líderes.

A responsabilidade para que possamos melhorar é, por isso, dos governos, das sociedades (na educação pela igualdade que devem promover) e das empresas. A Edenred, multinacional de benefícios sociais, que represento agora, em Portugal, é um exemplo de empresa que tem actualmente no seu desígnio promover a paridade e a diversidade dos seus cargos de gestão. Os valores da empresa, de paixão pelos clientes, respeito, imaginação, simplicidade e espírito empreendedor, estendem-se aos seus 10 mil colaboradores, dos quais 52% eram mulheres em 2019, com um board baseado no princípio do equilíbrio de géneros, com 40% de representatividade feminina. Para 2030, 40% é também o objectivo em termos de presença feminina em cargos de direcção executiva (compromisso expresso no plano Next Frontier), para todos os países onde a empresa está presente.

Em Portugal, a direcção executiva da Edenred tem um equilíbrio de 50%/50% entre homens e mulheres, para uma equipa total de 65% mulheres. No nosso caso, temos equilíbrio total, e estamos até no ponto de ter de ter a sensibilidade de assegurar também a paridade masculina, sempre com o objectivo fundamental de assegurar o valor da meritocracia, essencial para o bom funcionamento das empresas, assim como da própria sociedade.»

 

Este artigo faz parte do tema de capa da edição de Março (123) da Human Resources, nas bancas.

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