Hoje todos somos professores e o mundo é a escola

Num mundo onde tudo está em transformação, de forma cada vez mais acelerada, a única certeza é a de que temos de aprender todos os dias. Seja nas escolas, nas empresas ou no universo digital.

 

Por Agatha Arêas, Vice-presidente de Learning Experience do Rock in Rio e co-fundadora da plataforma Human Race

 

Foto: AgenciaZero.net

Em praticamente tudo na vida, quando conseguimos observar o mundo à nossa volta com um certo distanciamento, passamos a enxergar contextos mais alargados, vemos com mais clareza as relações de causa e efeito e, por vezes – estas mais raras do que gostaríamos – até encontramos a ponta do novelo que nos leva a respostas às tantas interrogações que coleccionamos nas nossas rotinas frenéticas e automáticas, que nos sequestram a habilidade de reflectir e fazer escolhas conscientes; aquelas que emergem da interacção de todos os sentidos que há em nós.

Mas o que é que isso tem a ver com o facto de que nunca se ter falado tanto em educação como agora?

Ora, num mundo mais novo a cada dia, onde tudo – absolutamente tudo – está em transformação, onde a mudança nos cumprimenta a toda hora e onde vivemos em modo indefinido, a única certeza que existe é a de que precisamos de aprender a desapegar-nos de modelos que funcionaram até pouco tempo atrás, mas que já não correspondem às novas configurações dos negócios, consumo, comunicação das relações de trabalho e até mesmo das relações em sociedade.

Percebemos então que é necessário reeducarmo-nos. E procuramos novos formatos de Educação, pois está claro que o modelo educacional – de forma geral e em todo o mundo – tem evoluído pouco ou nada, sendo incapaz de acompanhar a velocidade da transformação na mentalidade do ser humano.

Com a acessibilidade proporcionada pelo universo digital, a informação está disponível a todos, a qualquer momento, em qualquer lugar.

Entretanto, há vantagens e desvantagens nessa dinâmica: se por um lado podemos ter acesso rápido, e sem custo, às informações que procuramos, por outro, a maior parte dos conteúdos disponíveis não passam por nenhum tipo de controlo de qualidade. Muitas vezes, não têm sequer garantia de veracidade.

Além da dificuldade de filtrarmos o que nos interessa, há também o facto de que se deixarmos a busca por conta do algoritmo, vamos ter acesso sobretudo ao que já conhecemos, ao invés de escolhermos conteúdos novos, que complementam o nosso conhecimento, que nos provocam reflexão, que nos desafiam a desbravar o desconhecido.

Com estas oportunidades e ameaças, a verdade é que, nos dias de hoje, todos somos professores e o mundo é a escola.

 

O papel das empresas
A Educação – que até há pouco tempo ficava exclusivamente a cargo das instituições de ensino – está cada vez mais pulverizada e difusa, transformando-se num sem fim de conteúdos produzi dos e disponibilizados na internet por influenciadores, por anónimos, pelos tais algoritmos e, também, pelas marcas.

Desde sempre, muitas marcas contribuem como mecenas de instituições culturais e de ensino e subsidiam as mais diversas iniciativas educacionais, a fim de democratizar o acesso à educação.

Entretanto ainda são poucas as marcas que desenvolvem uma metodologia de educação, com base na cultura e nos valores da empresa e na expertise de desenvolvimento e implementação dos seus produtos e serviços.

Marcas como McDonald’s, Apple ou GE, têm a sua própria academia/universidade corporativa, um passo importante para o alinhamento de propósitos, valores, objectivos e processos da organização. E ainda que as academias corporativas sejam criadas para a formação dos colaboradores de uma empresa, várias delas desenvolvem programas tão interessantes que, a pedido do mercado, acabam por abrir portas para profissionais de outras empresas, como é o caso da Accenture Academy ou dos Leadership Programs da Siemens.

Em paralelo, algumas marcas investem cada vez mais em conteúdos educacionais na sua comunicação com o público, como, por exemplo, a Whole Foods, que faz crescer uma comunidade leal e comprometida, a partir da filosofia da marca, que nutre esse relacionamento em grande parte baseando-se em conteúdos que informam e educam sobre alimentação saudável e outros temas do universo da sustentabilidade. O Barclays é outro exemplo interessante, com o seu Barclays Code Playground, um website gratuito que ensina programação a crianças, e que faz parte do compromisso da marca de ajudar os seus clientes a prepararem-se para a transformação digital.

Disney, Universal Studios, Warner Bros, Blue Man Group, Faber Castell, Reserva, Mercedes Benz e Rock in Rio são algumas das marcas que já entenderam que podem usar a sua experiência para alavancar a qualidade profissional do mercado e para fomentar uma cultura de criatividade, empreendedorismo e inovação junto de crianças, jovens e profissionais das mais diversas áreas.

Em regra, a natureza da organização determina a abordagem que a marca adoptará nas suas iniciativas educacionais. Por exemplo, enquanto a Mercedes Benz se junta ao SXSW para criar a “Me Convention”, evento focado em inovação tecnológica, a Faber Castell cria espaços e workshops para trabalhar a criatividade com programas para miúdos e graúdos, grandes nomes do entretenimento como Disney, Universal Studios, Warner Bros, Blue Man Group e Rock in Rio usam a música, o teatro, o audiovisual e outros atributos incomuns numa sala de aula tradicional para criarem experiências de aprendizagem que mexam com os senti- dos, inspirem, promovam a experimentação e conectem os participantes, sejam estes colaboradores, parceiros ou o público em geral.

Foi Walt Disney quem introduziu o termo “Edutainment” pela primeira vez, em 1954. Na altura já acreditava que o entretenimento poderia trabalhar ao serviço da educação. E defendia que os seus livros, musicais, filmes e parques eram meios para transmissão e debate de valores, consciência cívica, história do mundo, psicologia, filosofia, entre outras “matérias”.

Quando o Rock in Rio cria uma unidade de negócios focada no desenvolvimento de experiências de aprendizagem, define que o conceito de “Edutainment” dará forma às tais iniciativas, comprometen- do-se a levar o conhecimento para dentro do entretenimento e o entretenimento para dentro do conhecimento. Esta aposta divide-se em duas grandes frentes: uma em que as experiências partilham o expertise da marca, como no caso da formação executiva Rock in Rio Academy (ver página 94), do livro de cultura organizacional “Rock in Rio, a Arte de Sonhar e Fazer Acontecer” ou do curso online de gestão de eventos e negócios “How to Rock in Rio”; e outra em que as experiências se focam no desenvolvimento pessoal, como o Rock in Rio Innovation Week, que dá palco para conteúdos que fomentam a inovação humana e o poder de transformação das pessoas, razão central da existência da marca Rock in Rio. A terceira edição da semana de inovação humana do Rock in Rio realiza-se entre os dias 23 e 26 de Junho, no LACS, em Lisboa, com três áreas orientadoras: “Autoconhecimento”, “Relações Humanas” e “Criação de Futuros Desejáveis”.

Não obstante o segmento de mercado em que actua, se a marca tem boa reputação, significa que, antes de mais, tem responsabilidade; responsabilidade, inclusive, de educar através da influência.

Melhor ainda quando esta responsabilidade vem acompanhada de uma oportunidade de escutar, aprender, trocar, co-criar, contribuir para uma melhor qualificação do mercado, inspirar novas gerações, e ainda conquistar novos interlocutores e fortalecer o relacionamento com os seus colaboradores e demais stakeholders.

 

Este artigo foi publicado na edição de Março da Human Resources, nas bancas.

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