Immanuel Kant e a gestão das motivações

Opinião de Fernando Neves de Almeida

Country President Boyden Portugal

Quase todas as pessoas que estudaram Gestão, Psicologia ou outras Ciências Sociais, se lembrarão de ter estudado uma teoria da motivação, da autoria de Maslow, apresentada em meados do Séc. XX, e popularizada por Douglas McGregor, na forma de Pirâmide das Necessidades, no seu fabuloso livro “O lado humano da empresa”.

Segundo essa teoria, o ser humano teria na base da sua conduta um conjunto de necessidades, cuja procura de satisfação determinava as escolhas efectuadas. Maslow começou por identificar as necessidades básicas – alimentação, bebida e sexo; as de segurança – física e psicológica; as sociais – de amizade, de amor e de relacionamento; as de auto-estima ou status e, finalmente, as de auto-actualização – desenvolvimento e comportamento ético; isto simplificando. Segundo Maslow, à medida que o ser humano tinha satisfeitas as necessidades mais “básicas”, iria começar a procurar satisfazer as mais “sofisticadas”. Quase se pode dizer, que quando não há pão, só de pão vive o homem.

Esta teoria, para além de ser um clássico na área do comportamento organizacional, tem servido de base a um conjunto de teorias de liderança e “modas” de práticas de gestão organizacional, que vão desde a criação de sistemas de incentivos, até aos modelos de gestão por objectivos e de gestão de carreiras.

Qualquer líder organizacional, que minimamente se preocupe em teorizar a sua prática, já reflectiu, certamente, sobre este modelo e, através dele, enquadrou muitas das suas práticas e resultados da gestão das equipas. Assim, de uma forma ou de outra, estudiosos e profissionais da gestão, estão gratos ao Dr. Maslow pela modelação útil e, supostamente original, que desenvolveu sobre esta temática.

Mas, será que é mesmo original?

Em 1793, um senhor genial chamado Immanuel Kant, filósofo, escrevia um livro “A religião nos limites da simples razão”, onde apresentou um modelo do que ele considera fazer parte do que designa por disposição originária para o bem na natureza humana. Segundo Kant, quanto à finalidade da acção humana, os elementos que a determinam podem ser agrupados em três classes:

1) Disposição para a animalidade do homem como ser vivo

2) A sua disposição para a humanidade, enquanto ser vivo e racional

3) A disposição para a sua personalidade, como ser racional e, simultaneamente, susceptível de imputação (moral)

A disposição para a animalidade, segundo Kant, tem três níveis:

1) Conservação de si próprio (sobrevivência e segurança)

2) Propagação da espécie por meio do impulso ao sexo

3) Disposição para conviver com outros (necessidades sociais)

No que diz respeito à disposição para a humanidade, Kant refere a necessidade que o ser humano tem de se comparar com os outros para obter per se um valor na opinião dos outros (status e auto-estima). Finalmente, a disposição para a personalidade é a susceptibilidade para a reverência pela lei moral, como um móbil, por si mesmo suficiente, do arbítrio (agir de acordo com a consciência, ou seja, realização máxima do ser humano).

É possível, mas improvável, que Maslow não tenha lido este filósofo. Porventura, utilizou este quadro de referência de Kant e testou-o, tentando provar a sua validade, o que conseguiu. Se assim foi, fantástico, pois é assim que o conhecimento avança.

Quanto mais coisas não poderemos aprender, e que nos podem ajudar a ser melhores líderes, lendo os filósofos?

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