MIT Sloan Management Review. A toxicidade no trabalho não é apenas uma questão de saúde mental

Demasiadas mulheres negras sentem que as suas empresas não agem perante incidentes de racismo e microagressões. E é fundamental notar que o nível de stress que estas mulheres experimentam não é “apenas” burnout; as condições prejudiciais do local de trabalho manifestam-se fisicamente.

 

Por Deepa Purushothaman e Valerie Rein, MIT Sloan Management Review

 

O dramático reconhecimento entre redes de segurança de saúde e sociais que irrompeu ao longo dos últimos anos já teve um grande impacto em quase todas as pessoas no local de trabalho. Muitos trabalhadores que admitem estar cansados, identificaram os seus empregos como uma fonte desse cansaço e questionaram a proporção das suas vidas que o trabalho consome. Alguns trabalhadores abandonaram as suas funções sob a bandeira da “Grear Resignation”, enquanto outros reavaliaram como querem viver. Eis o fio condutor comum: os trabalhadores estão a fazer mudanças significativas para darem prioridade à sua saúde física e bem-estar mental.

E é uma mudança realmente necessária, principalmente para as mulheres. As líderes femininas exigem mais do seu trabalho e mudam de emprego ao ritmo mais elevado de que há registo. Os dados continuam a mostrar que as mulheres estão entre os grupos mais afectados da era pandémica, com os desafios de gestão das necessidades das suas famílias.

Dentro deste grupo, as mulheres negras sofreram ainda mais. E, muitas, mostram sinais de estarem fisicamente doentes devido ao stress no local de trabalho. No processo de entrevistar mais de 500 mulheres profissionais e executivas negras para o seu livro “The First, The Few, The Only”, Deepa ficou chocada ao descobrir que duas em cada três mulheres lutavam contra condições crónicas relacionadas com o stress. A frequência destes sintomas e a semelhança entre centenas de histórias sugerem que podemos estar a ver não só um padrão, mas também uma crise.

 

Para além do burnout
As mulheres que entrevistámos e formámos estão constantemente em alerta para ameaças como microagressões, ser ignoradas para promoções, ou ser-lhes pedido que aguentem mais do que a sua justa quota-parte. Estas situações podem levar a estratégias desapropriadas (esconder parte da sua própria identidade, por exemplo) e agravar comportamentos como o excesso de trabalho. Esta vigilância também mantém as mulheres num estado constante de activação, deixando o seu sistema nervoso cronicamente em alerta máximo. Isto leva a uma série de resultados negativos, tanto na saúde mental como física, e faz parte da razão pela qual os locais de trabalho tóxicos deixam as mulheres negras doentes.

É fundamental notar que o nível de stress que estas mulheres experimentam não é “apenas” burnout; as condições prejudiciais do local de trabalho manifestam- -se fisicamente. Os sintomas persistentes incluem erupções cutâneas, problemas digestivos, problemas cardíacos, enxaquecas, problemas de fertilidade, fadiga adrenal e fadiga crónica.

Numa altura em que as empresas procuram líderes empáticos bem versados em questões de liderança e diversidade para gerir a complexidade e liderar equipas globais, as mulheres negras que poderiam ser os seus catalisadores afastam-se para cuidarem de corpos que atingiram um ponto de ruptura.

 

Quebrar o ciclo tóxico
Como tantas outras, as mulheres negras fazem a si próprias a pergunta mais importante: será que o meu trabalho e a minha carreira valem o custo? As empresas e os gestores devem, por sua vez, perguntar o que podem fazer para que o trabalho dos seus colaboradores valha de facto a pena.

Os gestores que querem reter estas líderes actuais e as futuras, e quebrar este ciclo tóxico, podem, com a orientação aqui fornecida, melhorar a carga de trabalho actual e estabelecer uma nova perspectiva para o bem-estar no local de trabalho.

 

Não faça mulheres negras adivinharem – comunique o sucesso
Uma vez que muitas mulheres negras são as primeiras nas suas famílias a desempenhar cargos profissionais, e poucas têm pares em posições semelhantes que possam consultar ou a que possam pedir ajuda, muitas vezes navegam sozinhas. Blanca foi uma clara “primeira”. Atingiu o nível mais alto que uma mulher negra alguma vez alcançara na sua empresa – Fortune 100. O inglês não era a língua nativa de Blanca, e ela sentia que tinha de trabalhar mais do que os seus pares para provar o seu valor e ser levada a sério. Escondeu frequentemente partes da sua cultura e dos seus antecedentes. O seu processo de avaliação para um cargo de líder de mercado regional, no topo do organograma da empresa, durou quase um ano. Numa manhã, num retiro da empresa e na altura da decisão de contratação, acordou incapaz de mover um lado do seu corpo ou de sair da cama. Após dolorosas horas a tentar chegar ao seu telefone, foi levada rapidamente para um hospital e diagnosticada com um problema cardíaco – que era tratável, mas foi avisada de que precisava de ir com calma.

O processo, que durou um ano, teve o seu preço e, em retrospectiva, Blanca andava cansada há meses. Tinha feito um tal esforço para ser o que pensava que a empresa queria, que perdeu partes de si mesma e sacrificou a sua saúde. No entanto, quando este incidente aconteceu, Blanca escondeu-o da sua equipa de liderança, envergonhada por o seu corpo estar a falhar e preocupada que qualquer fraqueza pudesse indicar ser incapaz. Há muito tempo que desvalorizava as dores no seu corpo, ignorando os sinais da exaustão e do isolamento de ser uma “primeira”. Disse a si própria que poderia abrandar quando chegasse ao novo cargo, mas a pressão só pareceu aumentar.

Blanca foi promovida para o cargo. Só após o processo ter terminado é que lhe disseram que ela sempre tinha sido considerada a mais indicada. O cargo tinha sido dela praticamente desde o início graças ao seu currículo e por ter vivido em muitos dos países da região. Os antecedentes que ela tinha tentado esconder foram, na verdade, uma mais-valia.

Blanca desejava ter recebido mais indícios de que era uma das principais candidatas, o que poderia ter aliviado a pressão que sentia como a “primeira e única” candidata negra à promoção. De facto, muitas mulheres negras com cargos de topo nunca receberam a informação de serem vistas como sendo de alto desempenho. Acreditam que podem estar a ser tidas em conta nos esforços de planeamento da sucessão, mas ninguém na empresa confirma se têm apoio ou estão no bom caminho.

Empresas e líderes podiam ajudar comunicando melhor o sucesso às mulheres negras. Com frequência, estas mulheres enfrentam microagressões e lutam contra estereótipos. Recebem frequentemente mais feedback negativo do que os seus pares. Seria bom que as empresas fizessem mais para contrariar estes desafios com apoio e comunicação explícita. Estas mulheres negras de alto desempenho são muitas vezes pioneiras e têm modelos limitados, pelo que se adaptam e transformam dentro das empresas. Os líderes precisam de encontrar formas de melhor sinalizar o apoio e validar que a liderança pode parecer-se com elas.

 

Leia o artigo na íntegra na edição de Agosto (nº. 152) da Human Resources, nas bancas. 

Caso prefira comprar online, tem disponível a versão em papel e a versão digital.

Ler Mais