MIT Sloan Management Review. Maçãs podres ou maus líderes

Em muitas empresas, os líderes têm de lidar com comportamentos desviantes no local de trabalho. E ónus é normalmente colocado nos colaboradores, mas não se deve descara outra causa provável: os próprios líderes.

 

Por Charn P. McAllister, Jeremy D. Mackey, B. Parker Ellen III e Katherine C. Alexander, MIT Sloan Management Review

 

Os líderes assumem normalmente a responsabilidade quando os colaboradores têm um mau desempenho, mas não quando os colaboradores têm um mau comportamento. É como se existisse uma regra invisível que protege os líderes quando os colaboradores se comportam de forma desviante no local de trabalho. Talvez esta protecção resulte da noção de que não é justo responsabilizar os líderes pelas acções de algumas “maçãs podres”.

A nossa pesquisa sugere que, surpreendentemente, esta visão do desvio no local de trabalho é, muitas vezes, falaciosa. Descobrimos que os líderes têm um forte efeito sobre se os colaboradores se envolvem em comportamentos desviantes. Assim, quando os colaboradores agem mal, os seus líderes deveriam dar um passo atrás e considerar se – e como – podem ser cúmplices desse comportamento.

Os desvios no local de trabalho incluem comportamentos dos colaboradores que violam as normas organizacionais, ameaçando o bem-estar das empresas e dos seus trabalhadores. Por vezes, estes comportamentos são dirigidos a indivíduos, como quando um colaborador é física ou verbalmente atacado por um colega, ou quando coscuvilha com colegas de trabalho. Outras vezes, estes comportamentos desviantes são dirigidos a uma organização, como quando um colaborador rouba bens do local de trabalho, ou divulga informações confidenciais da empresa. As consequências do desvio no local de trabalho incluem perda de produtividade e de inventário, bem como uma série de outras despesas, que acabam por custar às organizações milhares de milhões de euros anualmente.

Alguns líderes desvalorizam o desvio no local de trabalho como um efeito secundário inevitável de colaboradores apáticos ou rebeldes, que não se preocupam ou não gostam activamente dos seus colegas ou empregadores. Estas “maçãs podres” existem de facto. A pesquisa mostra que os colaboradores com baixos traços de personalidade, consciência e agradabilidade são mais propensos a desvios no local de trabalho. Assim como os colaboradores que exibem marcadores de personalidade socialmente malévolos, referidos como a tríade negra: maquiavelismo, narcisismo e psicopatia.

Dadas estas descobertas, é fácil concluir que o argumento da “maçã podre” faz sentido. O problema é que as pesquisas sobre o papel da personalidade no desvio no local de trabalho não tem em conta o papel que os líderes desempenham no comportamento dos colaboradores.

 

Chegar à raiz do problema
Para investigar mais amplamente os indicadores de desvio no local de trabalho, realizámos uma meta-análise abrangente da pesquisa sobre o desvio no local de trabalho. O nosso estudo baseou-se em dados de 235 estudos individuais com um total de 66 990 inquiridos, para examinar a multiplicidade de relações que os investigadores identificaram entre o desvio no local de trabalho e os vários factores que contribuíram para isso. Conseguimos usar estes dados para avaliar os efeitos tanto da personalidade como dos comportamentos de liderança, para compreender melhor como cada um é indicador de desvios no local de trabalho.

As nossas conclusões indicam que a supervisão abusiva – uma das muitas formas de liderança destrutiva que prevalecem no local de trabalho – é, pelo menos, um indicador tão forte de desvio no local de trabalho como a personalidade do colaborador. A supervisão abusiva é definida como a percepção, por parte dos subordinados, de uma hostilidade na supervisão, excluindo o contacto físico. Como conjunto de comportamentos, a supervisão abusiva inclui líderes que recordam aos subordinados os seus fracassos passados, que os humilham à frente dos outros, e que lhes mentem.

Além disso, tal como os actos de desvio no local de trabalho dos colaboradores aumentam à medida que os líderes se tornam mais destrutivos, os comportamentos benéficos de cidadania começam a diminuir. Ou seja, os colaboradores caracteristicamente bons podem enveredar pelo “quiet quitting” – retendo comportamentos positivos, tais como ajudar os outros e executar tarefas fora da sua descrição imediata de funções –, quando pensam que trabalham com supervisores abusivos.

Adicionalmente, embora alguma percentagem de colaboradores possa ser inerentemente propensa a desvios no local de trabalho, suspeitamos que seria raro encontrar grandes grupos destes colaboradores num único local, em qualquer altura. É lógico que, quanto maior for o número de colaboradores a comportarem-se mal, maior é a probabilidade de os seus líderes serem a raiz do problema, principalmente devido a comportamento abusivo.

Sabendo tudo isto, os líderes astutos deveriam questionar-se sobre o papel que desempenham, por mais involuntário que seja, no incentivo aos colaboradores para se envolverem em desvios no local de trabalho.

 

Ligar alvos a motivações
Os líderes podem acreditar que estão isentos de culpa se o desvio dos seus colaboradores não for dirigido directamente a eles, mas não é esse o caso. Os colaboradores podem agir contra os líderes, organizações ou colegas (ou uma combinação deles). Os alvos do seu mau comportamento são geralmente bastante fáceis de identificar: envolver-se em insubordinação e não seguir instruções sugere que os líderes são o alvo; roubar material de escritório e sabotar equipamento da empresa sugere que a organização é o alvo; e insultar ou embaraçar colegas de trabalho sugere que os colegas são o alvo.

De facto, por vezes, o alvo óbvio é a verdadeira fonte de qualquer problema contra o qual o colaborador age. Numa meta-análise separada em que examinámos a supervisão abusiva e o desvio no local de trabalho de forma mais ampla, constatámos que esta relação é particularmente forte quando o alvo do desvio no local de trabalho é o líder.

No entanto, é possível que os colaboradores vejam os seus líderes como representantes da organização e, consequentemente, actuem contra a organização por tolerar, permitir ou promover um líder abusivo. É também possível que alguns colaboradores estejam demasiado nervosos para considerarem agir contra os seus líderes ou organizações, por medo de sofrerem mais abusos ou serem despedidos, entre outras consequências potenciais. Estes indivíduos podem aceitar todos esses abusos e depois deslocar as suas respostas negativas, atacando em vez disso os colegas.

A questão é que, independentemente do alvo do desvio no local de trabalho, é ainda possível que os líderes sejam a causa principal. De facto, noutra meta-análise, descobrimos que a supervisão abusiva estava quase igualmente associada a desvios no local de trabalho dirigidos a pessoas e organizações.

 

Leia o artigo na íntegra na edição de Outubro (nº. 154) da Human Resources, nas bancas. 

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