Mudar: ideias, crenças e comportamentos

A mudança é um paradoxo. Por um lado, vive-se um tempo de mudança acelerada, reconhecido por todos. Nas organizações, empresariais ou outras, as pressões para tal são de natureza interna e externa, fruto da dinâmica socio-tecnológica e cultural (por exemplo, a consciência ambiental) e de forças motrizes poderosas – estruturais (como a transformação digital) ou conjunturais (por exemplo, emergência de canais/ comportamentos digitais de trabalhadores e consumidores).

Por Carlos Sezões, Managing partner da Darefy – Leadership & Change Builders

Os novos modelos de negócio requerem hoje ambientes colaborativos, orientados à agilidade e à rapidez na inovação. Cada vez menos o tempo (horários) ou o espaço (escritório, fábrica, loja física) são variáveis rígidas para o cumprimento das missões profissionais. Cada vez mais o capital tecnológico trazido pela digitalização, robotização e os invisíveis (mas omnipresentes) algoritmos será fundamental e terá de ser conciliado com o capital humano.

Por outro lado, se a realidade sentida e o discurso “oficial” apontam num sentido, a prática evidencia outro: uma certa resistência à mudança, visível em muitas organizações, fruto de inércia, receio ou ausência de competências para navegar para o desconhecido. Em concreto, a aversão a mudar estratégias, estruturas ou processos, mantendo-se no (por vezes enganador) conforto do status quo.  Os 8 passos que John Kotter propôs para liderar a mudança (Leading Change, 1995) são um bom guideline mas, muitas vezes, não serão uma receita infalível.

Ora os imperativos para a transformação organizacional, com vista à atracção de talento, começam a ser cada vez mais evidentes. Novas (e menos novas) gerações de profissionais procuram hoje “propostas de valor” que elevam o patamar de exigência muito além da compensação financeira – deste o foco na ética e no propósito, ao impacto social das empresas, das promessas de desenvolvimento pessoal e realizações à garantia de flexibilidade e de uma mais saudável integração pessoal-profissional. Tal exigirá um novo mindset e… mudança assente me novos princípios e comportamentos.

A propósito deste paradoxo, tive a oportunidade de ler recentemente Change: How to Make Big Things Happen, a obra de Damon Centola, Professor de Comunicação, Sociologia e Engenharia (combinação útil e versátil!) na Universidade da Pensilvânia (EUA). Como cientista social, tem estudado como acontecem efectivamente as mudanças, em particular, o efeito das networks e “redes de contágio”.  A crença comum sobre o modo como as ideias se propagam e se tornam poderosas assenta nos conceitos de “influencers” e de “viralidade” através das redes (antes, de proximidade física, hoje mais digitais). O problema é que atitudes e comportamentos concretos são (muito!) mais difíceis de mudar. Com excelentes exemplos da história recente (movimentos políticos, causas sociais e marketing de produtos), este fantástico livro apresenta uma abordagem inovadora para compreender o que impulsiona a mudança – da consciencialização à acção. Estabelece a diferença entre contágios simples (apenas estar ciente, informado e até acreditar em algo) e complexos (mudar, de facto, comportamentos).

Aplicando, de forma prática, esta abordagem à mudança das organizações… Por exemplo, não basta ter o maior influencer de uma empresa (em 99% dos casos, o seu CEO) determinar uma ideia ou decisão de mudança no encontro anual de quadros. É essencial agir sobre o significado e o impacto emocional do que se pretende mudar. É imprescindível que crenças, atitudes e (nomeadamente) comportamentos se disseminem, desde um núcleo de pioneiros e early adopters, em posições-chave, até à massificação ao longo da estrutura. Como seres humanos que reagem a estímulos sociais, apenas teremos tendência a mudar/ agir/ reagir quando os nossos “pares” começam adoptar as mesmas posturas, num efeito “bola de neve”. Aqui, a criação consciente e propositada de networks internas, com laços fortes e rotinas regulares de interação, será um factor decisivo. Neste efeito, propósito e conectividade devem ser vectores trabalhados de modo a inserir a mudança na cultura do dia-a-dia. Só assim se garantirá impacto e resultados em ambientes complexos, que (por enquanto) continuam a ser feitos de Pessoas para Pessoas.

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