O futuro exige adaptabilidade

Por João Nuno Bogalho, Gestor de Pessoas. Coordenador de pós-graduações no Instituto Piaget

 

Ao longo dos últimos anos temos vindo a valorizar crescentemente esta noção da Adaptabilidade. Da capacidade de entender e ter profundamente claro o ponto de chegada – o objetivo, o propósito, a real necessidade a suprir – tendo a capacidade de escolher o melhor caminho, de acordo com as circunstâncias conjunturais.

Longe vai o tempo em que sabíamos que, escolhendo um determinado caminho – forma, processo, metodologia – chegaríamos inevitavelmente ao mesmo destino, da mesma forma e com os mesmos resultados.

Já levamos uns anos valentes a entender e a incorporar o conceito VUCA. E a, pomposamente, dele falar e até escrever. Mas teremos noção das reais implicações em todas as dimensões?

Vivemos tempos de mudança profunda, de um enorme exigência de adaptabilidade, praticamente diária, a novas regras, exigências e necessidades. Com uma profunda exigência – criativa muitas vezes – para cumprir e fazer cumprir todas as regras e processos, para que os nossos negócios se mantenham fluídos de alguma forma.

Se esta realidade é assoberbada em todos os negócios com contacto direto com o público, ela não se desvanece por completo, nos negócios que não têm esse contacto direto.

O que começamos a notar, também agora, é um fosso significativo entre a construção e adaptação das normas, a sua aplicabilidade, em função da realidade que vamos todos vivendo.

Como já abordei numa opinião há umas semanas atrás, a capacidade legislativa e normativa, vem demasiado atrasada em relação à realidade que vivemos e que projetamos para o futuro. Se por um lado isto é entendível face ao desconhecido e novo, torna-se um pouco menos perceptível e aceitável face ao que já tínhamos como exigências e necessidades.

E aqui, nestas últimas, começam a saltar à evidência todas as normas criadas em função de conjunturas e circunstâncias, que, quando se alteram estruturalmente as condições e circunstâncias, parecem perder a sua adequabilidade, por via da incapacidade de, em função de um propósito claro, rapidamente se Adaptar o processo ao cumprimento do propósito.

Um exemplo super básico. A Medicina no Trabalho e a Higiene e Segurança no Trabalho.

Por um lado, assistimos ao crescimento exponencial do trabalho remoto, à deslocalização de pessoas dos grandes centros – junto às empresas – para outras zonas do país, mais baratas, com outras condições, com outras possibilidades. Porque, estando remoto, é indiferente se se está numa habitação caríssima junto de um grande centro, ou noutra qualquer zona do país, ou mesmo estrangeiro.

Por outro, a desertificação dos escritórios, chegando mesmo a situações em que os escritórios não são mesmo utilizados. Por ninguém.

E se há um ano atrás, a esmagadora maioria das pessoas afirmava que esta seria uma situação circunstancial e de curta duração, hoje já muitos de nós entendemos que, em muitas empresas, esta é mesmo a nova realidade. As pessoas trabalham em casa ou noutro local qualquer, eventual e esporadicamente irão ao escritório, ou trabalharão num noutro qualquer espaço à sua escolha.

E então como é a Medicina no Trabalho? Bom, é verdade que a maior parte dos parceiros tem uma dispersão geográfica significativa, que permite que os colaboradores tenham as suas consultas em distintos locais.

Mas, e quanto à segurança no trabalho? O aferir dos riscos? Já não há escritório. Cada um tem o seu escritório. Como fazemos? Faz-se esta identificação de riscos na casa de cada um? No cowork? E quem é responsável por isso? Relembramos que a escolha do local de trabalho é do Colaborador. E vamos fazer inspeções de locais de trabalho onde não está objetivamente ninguém?

E, quanto à formação em primeiros socorros? Faz sentido? Se cada um está num ponto diferente? E as evacuações? E os simulacros?

Um detalhe? Um proforma? Mas então porquê?

De tudo o que consegui saber sobre este tema, a legislação não mudou uma vírgula, e na verdade os pareceres solicitados às Entidades competentes são evasivos e assentes em princípios do antigamente.

Longe de ser uma crítica. É um alerta. Precisamos de soluções coerentes, porque muitos de nós já assumimos o novo futuro, já nos adaptamos. Já planeamos em função das novas realidades. Mas gerir, implementar políticas de gestão no novo normal que é tão óbvio, presos num paradigma e enquadramentos normativos tão lentamente reactivos, torna-se num pesadelo. Para todos.

Temos que nos adaptar. Todos.

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