O mito das horas produtivas

Quando pensamos em Gestão de Pessoas é fundamental perceber que o foco não deve estar no tempo produtivo “cronológico”  mas sim na “energia produtiva”.

 

Por Paulo Vieira de Castro, director do departamento de Bem-Estar nas Organizações do I-ACT – Institute of Applied Consciousness Technologies (EUA)

 

Em 1880 Paul Lafargue escreveu o manifesto “O Direito à Preguiça”, opondo-se à jornada de trabalho de 12 a 17 horas diárias. Isto numa França onde imperava a doutrina do trabalho dignificante e benéfico. Hoje parece-nos uma perfeita anedota relacionar tal horário com dignidade humana. No ano seguinte, em “Os Apologistas do Trabalho”, Nietzsche afirmava que “um tal trabalho é a melhor polícia, que retém cada indivíduo pelo freio e que sabe impedir com firmeza o desenvolvimento da razão, do desejo e do prazer da independência, pois faz despender enorme quantidade de energia nervosa, e subtrai essa energia à reflexão, à meditação, ao sonho, à inquietação, ao amor e ao ódio”.

Gerir a energia dos nossos recursos humanos em ciclos de produção leva-nos a pensar que trabalhar 12 , 8 ou 6 horas é, afinal, uma falsa questão. Na realidade, as pessoas não são máquinas, não funcionam por isso com base num tempo cronológico. Ao contrário, actuamos mais ou menos eficazmente por ciclos energéticos. E, cada um de nós tem o seu. Isso todos o compreendemos. Por que seria diferente no tempo passado nas organizações?

Assim, quando pensamos em Gestão de Pessoas é fundamental perceber que o foco não deve estar no tempo produtivo “cronológico”  mas sim na “energia produtiva”. Logo, as organizações deverão estar habilitadas para consolidar a energia humana. Isto é, o  que nos anima: energia, seja física, mental, emocional, sexual ou espiritual. Cada vez mais, é disto que dependemos quando pensamos em produtividade humana.

Então, se a nossa utilidade é também promovida por ciclos energéticos, como encontrar tal dimensão? Existem inúmeras  tecnologias de suporte ao bem-estar para as organizações que nos poderão ajudar nesse devir. Por agora vamos apenas teorizar esta ideia.

Uma centenas de anos depois de Lafargue e de Nietzsche , Agostinho da Silva fez o elogio fundamental do ser humano, desafiando-nos perante a sua ideia maior,  “o homem não nasce para trabalhar, nasce para criar”. E , isso não tem qualquer relação com o numero de horas de trabalho, acredito. Nos nossos dias, o psicólogo Contardo Calligaris defende, ainda a este propósito,  que o ser humano deveria procurar tornar  interessante o seu dia a dia, nunca a felicidade. Mais, para ele, esta última  é “uma ilusão mercadológica”. Talvez por isso reitere: “Nós temos um ideal de felicidade um pouco ridículo”. Afirmando, ainda, a intuito do tempo passado no trabalho que o “que a gente pode estudar são as condições do bem-estar; a sensação de competência no exercício do trabalho, já se sabe, é a maior fonte de bem-estar, mais do que a remuneração”.

A história que  muitos ignoram é que o actual horário de trabalho data do início do século passado, sendo resultado da intuição de um só homem. Na verdade, por essa data, houve alguém que decidiu duplicar o salário dos seus funcionário reduzindo, ainda, as horas de trabalho para oito. O seu nome era Henry Ford. Resultado? Em dois anos duplicou os lucros da empresa Ford Motor Company. Em consequência disso, muitas foram as empresas que seguiram este preceito. A regra passou a ser oito horas para trabalhar, oito para se divertir e oito para descansar. Há época tinha todo o cabimento. Mas, será que ainda hoje faz sentido? Creio que não.

Desde logo há que perceber que não se partiu de uma qualquer reflexão científica para sustentar a lógica do tempo vivido em três períodos de oito horas. Contudo, esta foi uma decisão fundamental para o espaço de bem-estar, saúde, lazer  e descanso de todos nós. Também por isso, acredito que a gestão dos recursos humanos deverá estar menos dependente do controlo do tempo (hora) produtivo e mais focada na gestão dos ciclos de energia humana no local de trabalho. Daqui se poderá concluir da importância das práticas e das tecnologias de suporte ao bem-estar nas organizações quando pensamos em gestão de recursos humanos.

 

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