O problema das equipas homogéneas

A diversidade no local de trabalho pode aumentar o conflito. Mas pesquisas também sugerem que se a equipa não tem diversidade, estará mais susceptível a decisões erradas.

 

Por Evan Apfelbaum, entrevistado por Martha E. Mangelsdorf, para a MIT Sloan Management Review

 

Muitas empresas concentram-se, compreensivelmente, na diversidade no local de trabalho, em questões como “como aumentar a diversidade”, “como chamar a atenção para a questão” e “como gerir uma força de trabalho diversificada”. Mas, segundo Evan Apfelbaum, professor na MIT Sloan School, e perito em pesquisas sobre diversidade e como esta afecta a tomada de decisões em grupo, os gestores devem também ter noção de outro tópico relacionado: os problemas associados à homogeneidade. Pesquisas recentes, incluindo uma de Apfelbaum, descobriram, por exemplo, que os grupos racialmente homogéneos são menos rigorosos ao tomarem decisões – e cometem mais erros – do que os grupos mais diversificados.

Martha E. Mangelsdorf, directora editorial da MIT Sloan Management Review, entrevistou o professor, aqui apresentado em versão condensada.

É perito em pesquisas sobre diversidade e como esta afecta a tomada de decisões em grupo. Fale-nos sobre os importantes estudos na área e o que descobriu?

Uma boa forma de pensar nisto é que os grupos diversificados têm potencial para ir mais longe do que os homogéneos. Na verdade, existem vários exemplos e razões por que isso não acontece frequentemente. Mas creio que existe uma vantagem única em ter grupos diversificados em certas áreas. Falo de cenários em que a tomada de decisões é cooperativa, onde as pessoas tentam trabalhar em conjunto para chegarem à melhor solução. Os primeiros trabalhos de há várias décadas forneceram as primeiras provas de que grupos diversificados oferecem soluções mais criativas, e isso deu origem a muitas das pesquisas recentes nessa área.

Um relatório que foi particularmente importante e útil teve lugar num contexto legal, com jurados. Nesse estudo, um investigador que agora trabalha na Universidade Tufts teve acesso a um conjunto real de jurados, pedindo-lhes aleatoriamente que deliberassem em júris de seis pessoas, todas brancas ou racialmente diversificadas. Os grupos analisaram o mesmo caso fictício e as suas deliberações foram gravadas em vídeo.

Em geral, os júris diversificados foram muito mais rigorosos na forma como abordaram as suas decisões e deliberaram durante mais tempo. Tiveram em conta uma gama mais vasta de perspectivas e ângulos relacionados com o caso – coisas diferentes que poderiam ter acontecido ou ser importantes. E fizeram declarações menos incorrectas nos seus debates.

Os júris diversificados não foram melhores do que os homogéneos porque, por exemplo, os júris negros acrescentavam informações novas que não estavam nos júris brancos. Na verdade, as diferenças mais gritantes estavam entre os júris brancos e os diversificados. Isto sugeria que estar na presença de um ambiente racialmente diversificado muda a forma como as pessoas pensam e debatem questões.

Pesquisas subsequentes analisaram grupos de estudantes a trabalharem em projectos, com efeitos semelhantes. Por exemplo, um projecto demonstrou que quando dizemos aos estudantes que eles vão ter um debate em relação a um artigo escrito, estes preparam-se com mais cuidado se souberem que terão de debater num grupo mais diversificado.

Nesse caso, pode ser porque o artigo tinha alguns componentes relacionados com a raça, e os estudantes queriam ter a certeza de que tinham uma forma bem ensaiada de pensar na questão. O estudo mostrou também que quando os investigadores pediam aos alunos que escrevessem ensaios para reflectirem sobre o que retiraram do debate, esses ensaios eram normalmente mais complexos e de qualidade mais alta quando o debate tinha lugar num grupo diversificado em termos raciais.

Estes são alguns efeitos importantes da diversidade. Agora, vamos para um contexto empresarial mais tradicional, que é competitivo e não cooperativo. Num relatório de que fui co-autor, perguntámos: O que acontece quando juntamos grupos diversificados versus homogéneos num cenário naturalmente competitivo? Para examinar este caso, analisámos mercados comerciais.

Aleatoriamente, escolhemos pessoas para grupos diversificados ou homogéneos em termos raciais, em dois estudos diferentes: um na Ásia e outro na América do Norte. As pessoas foram levadas para um laboratório e formámos pequenos mercados comerciais de seis pessoas, formando um grupo competitivo. Os participantes recebiam dinheiro verdadeiro e existiam diversas negociações comerciais em que os diferentes grupos estavam ligados por computador. Os participantes tomavam decisões sobre se gostariam de comprar ou vender bens e o seu objectivo era acabar com mais dinheiro no fim.

A única diferença entre os dois grupos foi que no início do estudo, os indivíduos viam quem estaria no seu mercado com base em quem estava sentado na sala de espera. E decidimos que metade destes grupos seriam aleatoriamente homogéneos. A beleza disto é que não era uma homogeneidade com “todos brancos”, porque também conseguimos fazer esta experiência na Ásia, onde a identidade cultural dominante não era branca. Por isso metade destes grupos via uma etnia singular e outra metade via uma maior diversidade de etnias.

Depois os membros do grupo foram divididos e começaram a negociar. Aqui surgiram alguns resultados interessantes. O primeiro é que existe uma diferença na precisão, na forma como as pessoas dão preços aos bens consoante o seu valor real. Nos grupos homogéneos houve mais imprecisão e preços errados e tendência para gastar mais nas coisas do que o seu valor real.

Outro factor interessante é que os erros foram, de certa forma, mais contagiosos nos grupos homogéneos do que nos diversificados. Ou seja, não só as pessoas dos grupos homogéneos tinham mais probabilidade de cometer erros a atribuir preços, como as outras pessoas desses grupos tinham mais probabilidade de copiar esses erros. As pessoas dos grupos homogéneos tinham maior probabilidade de presumirem que as outras pessoas do grupo sabiam o que estavam a fazer.

Nos grupos diversificados, as pessoas tinham menor probabilidade de confiarem na sabedoria das escolhas dos outros. E o resultado destas duas dinâmicas muito diferentes é que as bolhas nos preços, que são muito problemáticas nos mercados financeiros, e para a sociedade em geral, tinham maior probabilidade, neste contexto experimental, de se formarem em grupos homogéneos. A razão para tal é que as pessoas nos grupos homogéneos têm mais probabilidade de copiar os erros de outros – presumindo, erradamente, que o erro tem algum valor que elas simplesmente não compreendem. Nos grupos homogéneos, existe um efeito de escala em que as pessoas copiam as decisões erradas.

Portanto, conseguimos ver trajectórias muito diferentes mesmo dentro do laboratório, e de formas muito semelhantes em duas culturas muito diferentes, sugerindo que existe algo fundamental sobre trabalhar com semelhantes versus com outros que afecta as decisões dos indivíduos. Mais uma vez, é um contexto competitivo: as pessoas estavam realmente motivadas a tentar obter o máximo dinheiro possível porque, no final da experiência, ficariam com o dinheiro ganho. Isso sugere que as pessoas no grupo homogéneo estavam a tentar tomar as decisões certas – mas algo no contexto do grupo restringiu a sua capacidade para o fazerem.

Uma das ideias que tivemos é que talvez haja algo básico na conformidade. Por isso, basicamente fizemos uma variante daquilo que é uma das mais famosas experiências psicológicas alguma vez feita no domínio dos grupos: o paradigma da conformidade do psicólogo Solomon Asch, nos anos 50. Nesse famoso estudo, os participantes sentavam-se a uma mesa com pessoas que pensavam ser outros participantes no estudo, e olhavam para uma imagem de três linhas com três comprimentos diferentes.

Os participantes no estudo acreditavam que as outras pessoas à mesa eram igualmente participantes, mas estas estavam na verdade a trabalhar para a pessoa à frente da experiência. E este dizia, por exemplo, “digam-me por favor qual a linha mais longa”. Os participantes ouviam as respostas das outras pessoas, e todas estas diriam que a terceira linha era a mais comprida, quando era claramente evidente que na realidade a segunda linha é que era a mais comprida. A resposta era óbvia, mas os investigadores neste caso estavam a tentar perceber a probabilidade de os participantes aceitarem a resposta da maioria, mesmo sabendo que a resposta era a errada. Por outras palavras, até que ponto a pressão social nos afecta?

A pesquisa de Arsch descobriu que as pessoas cediam ao que sabiam ser a resposta errada cerca de 30% das vezes – o que é uma frequência bastante grande. Perguntámos se a diversidade mudaria a susceptibilidade das pessoas a esta predisposição.

Imitámos o mesmo paradigma com algumas alterações; em vez de linhas, usámos uma tarefa envolvendo candidaturas fictícias à faculdade, onde podíamos estabelecer que um candidato era claramente mais forte do que outro. Descobrimos que nos grupos só com brancos, a taxa de conformidade ao candidato claramente errado rondava os 30% – semelhante à pesquisa clássica sobre a conformidade. Em grupos diversificados, contudo, a frequência com que as pessoas cediam àquela que sabiam ser a resposta errada desceu significativamente, para 20% em algumas experiências, e até mais baixo noutras.

O mais interessante nestes estudos é que nós não permitimos às pessoas que falassem com os outros na sala. O que procurávamos não era o efeito de ter uma discussão ou ser persuadido por argumentos. Perguntámos: Será que estar simplesmente sentado numa sala e ver a constituição demográfica das pessoas à mesa tem efeito na propensão das pessoas para se conformarem às decisões dos outros?

E a resposta é sim – e que as pessoas tinham menor probabilidade de se conformarem em grupos diversificados. Semelhante às nossas suspeitas na experiência dos preços das acções, existe um efeito de dar o “benefício da dúvida” que acontece em grupos homogéneos, mas que não vemos em grupos diversificados; as pessoas nos grupos mais homogéneos têm mais probabilidade de assumirem que as outras pessoas do grupo sabem ou apanharam algo que elas próprias não perceberam. Nos grupos diversificados, as pessoas tinham maior predisposição para não acreditarem nesse tipo de pressuposto e chegavam a uma avaliação independente daquilo que acreditavam ser a verdade.

Quais os mecanismos que causam essas diferenças nos comportamentos?

A diversidade não é melhor nem pior – é simplesmente mais difícil. É mais difícil socialmente, mais difícil cognitivamente e faz com que tenhamos de trabalhar. E creio que esta estrutura é útil para pensar na razão por que a diversidade pode ser vantajosa e complicada no local de trabalho e em grupos que tomam decisões.

Quando nos encontramos em eventos sociais, há uma tendência natural para gravitar na direcção de pessoas que são semelhantes a nós. É mais fácil encontrar pontos em comum com pessoas que têm antecedentes semelhantes aos nossos – quer em termos de cultura, de competências organizacionais, de linguagem ou de percurso académico. É natural. Oferece-nos uma noção de ligação e é mais fácil – e acho que faz sentido. A diversidade é mais difícil pelas mesmas razões. Não nos permite dormir sobre os louros conquistados e estamos menos preocupados, de certa forma, com o facto de pertencermos aos grupos diversificados.

Penso que as pessoas simplesmente acabam por ser mais independentes e objectivas nos grupos diversificados. E isso pode correr bem em cenários como os que acabei de mencionar, mas está também, acredito, na base de outras pesquisas que mostraram que a diversidade pode dar origem a conflitos e falta de confiança. Algumas pesquisas, por exemplo, mostram que até um nível normal de conflito nas equipas é visto mais rapidamente como um tipo sério de conflito aos olhos dos gestores quando o grupo é mais diversificado racialmente em comparação com os grupos homogéneos. Um estudo muito recente apresentou aos participantes uma troca entre membros de uma equipa. E os investigadores mudaram apenas um componente muito pequeno dessa troca – se as pessoas acreditam que quem estava envolvido nesta troca, criada para ser um debate de nível médio, era um grupo diversificado ou homogéneo.

Os investigadores descobriram que as pessoas no cargo de gestores tinham muito maior probabilidade de pensar que o nível de conflito das equipas diversificadas era mais alto, embora a troca fosse exactamente a mesma. E, por sua vez, os gestores tinham menor probabilidade de sugerir que deviam ser fornecidos mais recursos às equipas diversificadas para que estas pudessem acabar projectos futuros. De certa forma, os gestores estavam a dizer: “Não podemos investir; isto é uma forma de conflito irreparável.” Por isso, o nível de conflito parece ser visto como artificialmente mais alto nos grupos diversificados do que nos grupos homogéneos.

Creio que no que toca a género, raça e etnia, existem questões na nossa sociedade que estão carregadas de falta de confiança e incerteza, por isso existe um limite mais baixo para as pessoas encontrarem provas que sejam consistentes com isso ou para se afastarem dos seus grupos, acusarem outros ou entrarem em formas poucas produtivas de conflito em grupos.

Mencionou pesquisas sobre o custo da diversidade e os conflitos que podem acontecer, e como esta pode rapidamente tornar-se pouco produtiva. Fale-me um pouco sobre essa pesquisa.

Existem muitas pesquisas feitas nas últimas décadas que descobriram em equipas de trabalho reais que as pessoas de equipas diversificadas reportam níveis mais altos de conflito. Gostam menos disso. Sentem-se menos confortáveis. E existem vários estudos diferentes que demonstraram mais conflitos interpessoais nas equipas diversificadas.

Outra descoberta interessante… Num artigo, os investigadores olharam para uma tarefa cooperativa que envolvia tomar decisões. Os participantes no grupo tinham de reunir informações díspares – pistas – para fazer uma única recomendação sobre o suspeito certo a prender.

Os investigadores descobriram que nesta tarefa, como tem sido demonstrado em pesquisas anteriores, os grupos diversificados tendem a considerar mais perspectivas, e no fim tinham mais probabilidade do que as pessoas dos grupos homogéneos de chegarem ao suspeito certo.

Mas outro resultado muito interessante que surgiu neste estudo ocorreu quando os investigadores perguntaram: Até que ponto está confiante de ter identificado o suspeito certo? E embora os grupos diversificados tenham sido mais correctos do que os grupos homogéneos, na verdade os grupos homogéneos tinham mais confiança nos seus resultados – o oposto do que seria de esperar.

Podíamos pensar nisto como um desafio para a diversidade ou uma limitação para a homogeneidade. Sugere que os grupos diversificados com os mesmos resultados dos grupos homogéneos podem sair de uma reunião a sentirem-se menos confiantes de terem atingido o objectivo ou a solução mais adequados do que um grupo homogéneo. E o que sabemos sobre confiança em contextos organizacionais é que esta é reforçada. Se estamos a gerir dois grupos e um deles chega e diz “temos 95% de certeza que isto vai estar dentro do prazo e dentro do orçamento” e outro grupo diz “temos 75% de certeza”, no mundo real nove em cada 10 vezes é o grupo que diz ter 95% de certeza que será escolhido para seguir o seu projecto.

E o que vi destes dados é que há mais probabilidade de ouvirmos a história dos 95% do grupo homogéneo – mas não por eles terem mais probabilidade de apresentar melhores resultados. Os grupos homogéneos podem simplesmente ser menos precisos. Nos grupos homogéneos, parece haver uma maior sensação de confiança, em parte por causa do fenómeno descoberto na pesquisa de que falei antes. Esses grupos podem não estar a ter todas as perspectivas em conta. E há maior tendência para ver, de forma limitada, as questões de maneiras consistentes com os pontos de vista das outras pessoas e talvez sentir menos conforto para discordar delas.

E estas descobertas sobre equipas? Os executivos devem pensar que, ao terem de tomar uma decisão complexa, o grupo que toma decisões deve ser mais diversificado?

Certamente. Quando temos de fazer uma alteração grande a nível organizacional, as pessoas envolvidas normalmente vêm de muitos grupos funcionais, para que todos possam ver os ângulos mortos dos outros até certo ponto.

Creio que esse deveria ser o status quo nas organizações. E acredito que, com uma cultura inclusiva, a falta de naturalidade e de conforto que as pessoas normalmente associam aos grupos diversificados pode ser normalizada.

Se pensarmos em muitos dos dados que analisámos, pelo menos uma parte deles indica, de forma objectiva, que a homogeneidade produz resultados estranhos. Basta pensar na questão do excesso de confiança. E na quantidade de imprecisões. Mas não conheço um único programa no mundo que se concentre nos possíveis ângulos mortos das equipas homogéneas. E não creio que seja apenas da narrativa porque, em muitos sectores, é normal existirem equipas homogéneas.

Mas mesmo que as equipas homogéneas sejam normais no sentido de serem comuns, há razão para questionar até que ponto são normais de outras formas. Em vez de se olhar para a gestão dos grupos diversificados como um problema a resolver, é útil mudar a perspectiva por um segundo: O que podemos fazer em relação aos aspectos problemáticos das equipas homogéneas?

 

Este artigo foi publicado na edição 94 da Human Resources. 

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