Que atletas precisamos na corrida ao digital?

Se os dois últimos anos provaram que é praticamente impossível existir fora do digital, mostraram também que muitos o fizeram demasiado depressa e sem uma estratégia definida.

 

Por Ana Bicho, CEO da Adclick

 

Imagine uma maratona com milhares de corredores, em que todos querem chegar em primeiro e precisam manter um ritmo elevado num percurso que se adivinha longo. Esta é a imagem que talvez melhor descreva a corrida das empresas para o digital: ninguém quer perder a corrida, mesmo as que não têm qualquer preparação ou, sequer, o equipamento adequado para uma prova tão exigente.

Sim, é verdade que foram (e são) tempos difíceis e que é sempre melhor reagir e entrar na corrida do que ficar para trás. No entanto, muitos perderam o fôlego e outros parecem perdidos no caminho. E, ao analisar o que correu ou corre mal, talvez alguns tenham percebido que, para enfrentar um percurso difícil, competitivo e que está em constante transformação, é necessário treino. Ou, pelo menos, atletas bem treinados. Ou seja, é preciso que a estratégia para a maratona digital possa ser delineada por quem sabe como movimentar-se neste caminho: os especialistas em Marketing Digital.

Nem todas as empresas têm um departamento de Marketing, muito menos um de Marketing Digital. Mesmo tendo, as mudanças e alteração são tantas e tão rápidas que nem sempre é fácil, mesmo para os especialistas, estarem constantemente actualizados.

Os famosos algoritmos da Google, por exemplo, fundamentais para definir o que os consumidores encontram primeiro — logo, para ajudar a determinar o que vão consumir — podem mudar 500 a 600 vezes num ano, pelo que qualquer estratégia implementada com sucesso pode falhar de um momento para o outro. E, claro, num contexto em que tudo está centrado no consumidor, há que ter em conta que os seus desejos e necessidades (tal como vimos durante a pandemia) podem mudar ainda mais rapidamente que a própria tecnologia.

 

Soft skills fundamentais (e difíceis de encontrar)
Como podem as empresas responder a este desafio? Primeiro, devem perceber que não basta querer fazer, é preciso recorrer a quem saiba fazer. A solução será contratar recursos humanos especializados? Dar formação aos que já se tem? Trabalhar com parceiros especialistas no tema? A resposta correcta provavelmente é apostar nas três vertentes.

Como já vimos, o ritmo da transformação é de tal forma veloz que são necessárias equipas dedicadas para perceber as mudanças e para responder da melhor forma e em tempo útil, pelo que a escolha de parceiros especialistas e adequados à necessidade de cada empresa é muito importante.

Isto não significa, porém, que não valha a pena apostar na formação dos recursos internos. Muito pelo contrário, é fundamental ter uma base sólida de conhecimento. Mesmo contratando parceiros externos, é necessário ter em casa quem saiba o suficiente para servir de pivô entre os mesmos e as necessidades da empresa e do negócio.

Já a questão da formação traz ainda outro problema: o que se aprende hoje corre o risco de rápida desactualização. Assim sendo, mais do que contratar competências técnicas ou capacitar recursos humanos, é preciso não esquecer outros requisitos fundamentais para um bom profissional nesta área: capacidade para uma adaptação rápida a novas circunstâncias, total disponibilidade para uma aprendizagem constante, sem descurar a criatividade, ter espírito crítico e analítico para saber interpretar resultados, e, finalmente, ser um pesquisador nato.

No seu conjunto, estas são soft skills difíceis de encontrar juntas. A prova é que, segundo um estudo do Digital Marketing Institute e do The Economist Group, 74% das empresas de marketing norte-americanas e britânicas sentiram, ainda em 2019, falta de recursos humanos com estas características.

E se o recrutamento já é difícil, há ainda outros desafios acrescidos para as empresas: a elevada rotação destes profissionais, bem como a crescente atracção dos mesmos pelo trabalho remoto.

Esta concorrência global tem facilitado processos de “internacionalização” de Recursos Humanos, permitindo que um português possa, a partir de casa, colaborar com uma empresa nos EUA. Sem burocracias, sem vistos, sem deslocações. Só para percebermos a dimensão desta tendência: um estudo da MBO Partners, citado pela BBC, revela que, em meados de 2020, o número de nómadas digitais nos EUA passou de 7,3 milhões para 10,9 milhões de pessoas.

Para as empresas, o facto de poderem contar com recursos humanos de qualquer ponto do mundo é uma oportunidade, mas é também mais um desafio. A alternativa, para quem quer continuar na corrida — e com hipóteses de não desistir — é, assim, dedicar tempo e orçamento para ter, a nível interno ou externo, quem tenha esta capacidade e disponibilidade para acompanhar a evolução e para agir e reagir em conformidade. Ou seja, deixar correr quem sabe.

 

Este artigo foi publicado na edição de Fevereiro (nº.134)  da Human Resources, nas bancas.

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