Segurança psicológica, uma viagem colectiva

As crises económicas globais, os eventos geopolíticos mais tensos, os conflitos a preto e branco e a dança das alianças internacionais, as alterações climáticas extremas, a par com um País às avessas onde os sistemas responsáveis por assegurar necessidades básicas como saúde, educação, habitação, entre outras, falham não me parece o melhor enredo para se falar num estado de segurança psicológica.

Por Joana Russinho, People Enthusiast, head of Human Resources e autora de “Eu e os Meus rh

Quem, neste momento, não sente um rasgo de medo por si, pelos seus e/ou pelo futuro, ponha a mão no ar. Por muito confiantes que sejamos, a realidade é inegável. O presente não é bom, apesar de daqui a um tempo já ser passado e a maioria de nós procurar, agora, recuperar os seus abrigos. Alguns na esfera pessoal, outros na esfera profissional, ou, quiçá, em ambas.

As áreas da vida pessoal e profissional podem ser distintas e as dinâmicas e fatores que contribuem para o bem-estar psicológico podem variar entre si. Cada um de nós, para alem do contexto onde se insere, tem as suas idiossincrasias, relações pessoais e familiares, os seus interesses e motivações pessoais, o seu barómetro de saúde mental e física, a titulo de exemplo. E ainda que se possa sentir falta de segurança no trabalho, é possível experienciar apoio emocional, compreensão e satisfação em outras áreas da vida.

Ora, deixemos a ordem mundial que não conseguimos travar, deixemos as estratégias pessoais para quem delas pode legitimamente falar, e foquemo-nos no que eu, neste caso, posso partilhar: a segurança psicológica no microcosmos laboral.

Num ambiente psicologicamente seguro, as pessoas sentem-se à vontade para serem autênticas, abertas e vulneráveis, promovendo uma comunicação mais eficaz e atraindo a colaboração. Isso é fundamental para o desenvolvimento de um ambiente de trabalho saudável, onde as pessoas se apoiam mutuamente, partilham ideias e são encorajadas a assumir riscos necessários para a inovação e o crescimento. O que terá algum impacto na esfera pessoal. Tenha-se em conta que a segurança psicológica não significa ausência de opiniões contrárias (cenário onde perderíamos a riqueza de diferentes perspectivas), mas sim a criação de um ambiente onde essas não concordâncias podem ser abordadas de forma construtiva, sem receio de eventuais repercussões menos positivas.

E onde a podemos procurar, em que tipo de empresas? Sabemos que as. empresas que seguem as diretrizes do ESG (Ambiental, Social e Governança) e estão comprometidas com práticas sustentáveis e responsáveis, tipicamente incorporam iniciativas para promover a segurança psicológica do seu Talento. Talvez por isso esta seja uma pergunta cada vez mais frequente em sede de atracção de talento. Revelar como a empresa está comprometidas com práticas responsáveis e sustentáveis, traz uma segurança relativa quando o essencial parece uma realidade distante.

E a que práticas me refiro?

1. À promoção de uma Cultura de Inclusão e Diversidade, que valorize a diversidade e a inclusão, onde todas as pessoas se sintam respeitadas e aceites como parte integrante da empresa e onde exista um genuíno interesse pela multiplicidade de experiências e perspetivas individuais;

2. Ao investimento em capacitação que potencie a compreensão sobre questões relacionadas com a saúde mental, o stresse e a resiliência, com acesso a Programas de Saúde Mental, que integrem sessões de aconselhamento, suporte psicológico e acesso a recursos para ajudar as pessoas a nível físico, a nível psicológico, ao nível de literacia financeira, entre outros;

3. À existência de redes informais de apoio entre colegas, ou programas institucionais de coaching, que sejam facilitadores de união;

4. Ao incentivo a uma comunicação aberta e transparente onde todos se sintam chamados a expressar as suas preocupações e opiniões sem medo de represálias, assegurando que as políticas e práticas da empresa, principalmente as relacionadas com a gestão de pessoas, são inequívocas;

5. Ao desenho e implementação de políticas que promovam o equilíbrio entre o trabalho e vida pessoal, reconhecendo e incentivado a importância de descansar e de ter tempo livre, através do usufruto de férias e de dias de pausa, bem como práticas de trabalho flexíveis;

6. Ao reconhecimento e celebração conjunta de conquistas individuais e coletivas, para promover um ambiente positivo e de apoio, e/ou o desenvolvimento de  programas de reconhecimento que incentivem a colaboração e destaquem contribuições específicas.

7. À implementação de canais para receber feedback regular das pessoas e agir sobre as suas preocupações;

8. À potenciação de oportunidades de desenvolvimento profissional e de capacitação, para promover o desenvolvimento contínuo, assente em planos de carreira que incentivem a realização e o progresso individual.

9. A exemplos de liderança observáveis, dignos de registo e de orgulho.

Mas a responsabilidade não é unilateral. Cabe a cada um de nós fazer a sua parte para contribuir para a própria segurança psicológica no seu local de trabalho: Já pensaram como? Deixo aqui algumas sugestões:

1. Dê o exemplo: comunique com os seus colegas de forma transparente, partilhe conhecimento e informações, encoraje a expressão de ideias. Respeite e faça-se respeitar, valorizando as diferenças e reconhecendo a diversidade;
2. Não faça o contrário do que diz, seja coerente;
3. Cultive relacionamentos saudáveis de colaboração;
4. Desenvolva a empatia: exercite a capacidade de se focar no conteúdo da mensagem, escute primeiro, entenda a perspectiva dos outros;
5. Dê feedback construtivo e solicite-o também: não espere que alguém se lembre de o fazer por si;
6. Deixe de lado jargões contra a inovação como “sempre foi feito desta forma”: esteja receptivo a experimentar novas formas de atuar; experimente, colabore;
7. Atente no seu próprio equilíbrio entre trabalho e vida pessoal: reconheça os seus limites e partilhe-os;
8. Seja agente do seu desenvolvimento; procure oportunidades para o desenvolvimento profissional e o crescimento na carreira.

Concluindo, num contexto em que o mundo se depara com desafios globais hollywoodescos, a procura pela segurança psicológica assume uma importância crescente, especialmente no local de trabalho, onde passamos a maior parte do nosso dia, e no qual confiamos.

Empresas capazes de criar espaços onde a autenticidade, a abertura e a vulnerabilidade são valorizadas, estão a contribuir para ambientes de trabalho saudáveis. Ao mesmo tempo, a promoção de práticas empresariais alinhadas com os princípios do ESG deixou de ser “apenas” uma medida de responsabilidade social, para representar uma estratégia vital para cultivar a segurança psicológica dos colaboradores.

No entanto, a responsabilidade individual também emerge como um elemento-chave, com o dever, atrevo-me a dizer, de cada indivíduo trabalhar e contribuir para um ambiente de trabalho positivo.
Assim, no atual panorama, a busca por tão necessária segurança psicológica emerge como uma viagem coletiva, onde tanto organizações quanto indivíduos desempenham papéis cruciais na construção de um futuro mais resiliente e centrado no bem-estar.

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