Vera Pinto Pereira, EDP: «Diversidade traz às empresas uma rentabilidade que chega a ser 36% superior»

Vera Pinto Pereira, membro do Conselho de Administração Executivo da EDP, CEO da EDP Comercial e presidente do Conselho de Administração da Fundação EDP, destaca que «as empresas líderes na promoção da diversidade étnica e cultural têm também uma rentabilidade que chega a ser 36% superior».

 

No especial sobre “Liderança no feminino”, foi uma das 12 mulheres em cargos de topo em Portugal que partilhou a sua experiência e visão sobre o tema da Igualdade de Género.

 

Quais foram os principais desafios ultrapassados para chegar onde está hoje? Alguma vez se sentiu em “desvantagem por ser mulher?
Mais do que desafios, houve etapas no meu percurso que foram determinantes para construir este caminho profissional. Iniciei a minha carreira em Consultoria, um trabalho exigente e que me dotou de uma característica que considero fundamental – a resiliência. Depois, com 25 anos, decidi fazer um MBA no INSEAD e, de seguida, escolhi lançar um novo negócio, um passo no empreendedorismo que me deu uma visão clara sobre a importância de desenvolvermos uma dimensão comercial em tudo o que fazemos.

A passagem para o mundo corporativo trouxe-me estrutura. Comecei pelo sector das Telecomunicações, e o desafio de conseguir cumprir uma agenda de projectos numa grande empresa, sendo apenas uma parte num enquadramento maior, deu-me características fundamentais de adaptação e resiliência.

A saída de Portugal para a FOX foi uma prova pessoal importante, para reforçar e confirmar o meu valor num plano internacional. Foi também mais um passo na minha experiência a liderar, e que me permitiu consolidar algumas dimensões importantes. Por último, a vinda para a EDP tem um significado muito marcante. Saí da minha zona de conforto, não só pelo sector, bem diferente, mas também pelo nível de senioridade da função.

Não considero ter tido alguma desvantagem por ser mulher. Mas sinto a responsabilidade acrescida por sê-lo, e por assegurar uma gestão diversa, com os muitos benefícios que a diversidade traz a uma organização.

Por outro lado, enquanto mulher e mãe, vivi ao longo da minha carreira etapas mais desafiantes na conciliação desses papéis, que encaro com enorme compromisso e prioridade, com a dimensão profissional. Mas acredito muito que tudo é conciliável, e esse equilíbrio é para mim fundamental.

 

Qual a importância da diversidade de género nos cargos de liderança das empresas? É sobretudo uma questão de igualdade de oportunidade ou de negócio?
A diversidade, não só de género, é benéfica para as organizações. Não é só uma opinião, que partilho e promovo – está estudado e provado. Por exemplo, no ano passado, a McKinsey & Company analisou mais de mil empresas, em 15 países, e comprovou que as organizações com maior diversidade de género tinham 25% mais probabilidades de registar lucros acima da média, se comparadas com aquelas que ainda não têm tanta diversidade. Os números são ainda mais interessantes se olharmos para a diversidade como um todo. As empresas líderes na promoção da diversidade étnica e cultural têm também uma rentabilidade que chega a ser 36% superior.

Se olharmos para empresas do FTSE 350 [Financial Times Stock Exchange ] que têm na sua comissão executiva pelo menos 33% de liderança feminina, dados ainda mais recentes mostram que estas organizações registaram uma margem de lucro líquida 10 vezes superior.

Estes estudos só vêm provar que equipas diversas representam uma colecção mais alargada de experiência, pontos de vista e backgrounds, que resultam em melhores tomadas de decisão. Numa altura em que vivemos revoluções profundas na sociedade, não só por causa da pandemia, mas pela evolução tecnológica, pelo desafio ambiental, entre outros, esta diversidade deve ser cada vez mais incentivada.

 

É possível identificar um estilo de liderança mais masculino e mais feminino? Ou os diferentes estilos de liderança dependem sobretudo da personalidade de cada pessoa, independentemente do género? E existirão especificidades de sector para sector, sendo que alguns são considerados mais “masculinos”?
Mais do que ser-se homem ou mulher, os estudos têm revelado que existem características tipicamente associadas a pessoas em posições de liderança. Por norma, são pessoas motivadas, ambiciosas, determinadas, orientadas para as tarefas e boas a resolver problemas. A assertividade e o rigor também são característicos de um líder. E, claro, a capacidade de motivar, a coragem e estabilidade emocional, assim como uma compreensão clara das necessidades dos colaboradores.

Uma combinação de traços de personalidade, com aprendizagens adquiridas no contexto social e cultural de cada um, vai, naturalmente, influenciar a forma de liderança, assim como ter impacto no estilo de liderança que cada pessoa poderá assumir.

 

Estudos indicam que, ao ritmo actual, serão precisos cerca de 100 anos para se alcançar uma efetiva igualdade de género. Mas o tema das quotas é sempre polémico, porque levanta a questão de se poder estar a sobrepor o género à competência. Como vê este tema e como acha que se pode acelerar esta tendência, para casos como o seu deixarem de ser excepção?
As quotas não são, para mim, um tema pacífico e de resposta óbvia. No entanto, se compararmos países com diferentes níveis de adopção desta medida, existe uma correlacção positiva entre a utilização de quotas e a presença de mulheres em cargos de liderança.

Ambiciono que cheguemos rapidamente a um equilíbrio neste tema, que faça com que as quotas deixem de ser necessárias. No entanto, ainda são importantes, porque permitem encurtar o espaço entre as mulheres e as oportunidades, assim como quebram estereótipos e barreiras e ajudam a inspirar a próxima geração de mulheres líderes. É relevante que as nossas jovens se possam rever nas posições actuais de liderança e possam materializar que é possível alcançar o que ambicionam.

Mas criar quotas não pode ser um caminho isolado para se endereçar este tema. É também importante preparar a próxima geração de mulheres para cargos de liderança. É preciso trabalhar, não apenas ao nível do equilíbrio de género no recrutamento, mas também ao nível da progressão das mulheres nas organizações. Enfrentamos hoje um desafio a que as empresas chamam de “gender leakage”, que é preciso endereçar para poder acabar rapidamente com as quotas nos lugares cimeiros.

Por fim, não acredito no sucesso do maior equilibro de género nas empresas sem uma evolução paralela na dimensão familiar. É fundamental encontrar mecanismos para incentivar e viabilizar uma maior participação dos homens na esfera familiar, para que todo o ecossistema seja equilibrado e positivo para ambos os géneros.

Também na EDP, estamos a percorrer um caminho em direcção a uma maior diversidade. A representação feminina tem vindo a aumentar e actualmente temos 26% de mulheres no grupo EDP, 25% em cargos de liderança e 40% no Conselho de Administração Executivo. Queremos continuar a aumentar os nossos objectivos, pelo que actualizámos recentemente os nossos compromissos com metas ambiciosas: 30% de representação feminina até 2025 e 35% até 2030, tanto no número de colaboradores como em posições de liderança.

 

Este artigo faz parte do tema de capa da edição de Março (123) da Human Resources.

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