Gestão de pessoas 2021: Paraíso ou inferno?
O actual contexto trouxe mudanças repentinas às empresas e novos desafios aos gestores de Pessoas, colocando-os também sob os holofotes. Há vários factores que podem facilitar ou dificultar o trabalho das direcções de Recursos Humanos e tornar 2021 um paraíso ou um inferno.
Por Pedro Fontes Falcão, gestor e professor universitário
Uma questão muito relevante na Gestão de Pessoas que se está a alterar com a pandemia é que a gestão que era feita da experiência de trabalho está a caminhar na direcção da gestão da experiência da vida dos colaboradores. Ora, as direcções de Gestão de Pessoas/Recursos Humanos, embora já percebessem anteriormente que a vida extra-profissional dos colaboradores podia ter impacto na sua vida profissional, não tinham muita influência – nem era suposto questionarem muito, e ainda menos interferirem –, na vida pessoal das pessoas. Aliás, poderia por vezes ser visto como uma intervenção menos ética ou intrusiva dos gestores de Pessoas.
Contudo, quando uma percentagem mais elevada dos colaboradores está a trabalhar a partir de casa, pelo que a casa passa a ser o local de trabalho – e ainda mais num contexto de crise de saúde pública –, a vida “no seu todo” (pessoal e profissional) acaba por ter mais impacto no trabalho e, logo, passa a ser uma preocupação dos gestores de Pessoas.
Outra alteração que prevejo para 2021 e anos seguintes será que, numa expressão feliz de Brian Kropp (Gartner), a «flexibilidade passará da localização para o tempo». Já anteriormente tinha escrito aqui na Human Resources Portugal que a flexibilidade será chave, a diferentes níveis, no futuro. Um nível em que aumentará, obviamente não se aplicando a todos os casos, será o tempo – não só em que altura do dia os colaboradores desempenham as tarefas, mas também a duração das mesmas. Isso implicará que a gestão de um maior número de colaboradores será mais orientada para o atingir de objectivos/outputs e não o seu timing.
Isto tem implicações não só na avaliação de desempenho, mas também toda a “jornada do colaborador” sofrerá impactos. Ainda muito recentemente uma grande organização me contactou para os ajudar no onboarding de novos colaboradores, pois estavam preocupados com isso. Ou seja, desde o recrutamento até ao eventual despedimento, a comunicação e o contacto serão mais (nalguns casos, apenas) virtuais.
Temos também a questão da gestão do stress. Embora as actividades de redução de stress que se poderiam gerir num escritório ficaram limitadas, há mais abertura dos colaboradores e das organizações para lidar com questões relacionadas com o stress e também com a saúde mental, embora ainda estejamos longe de “normalizar” estas questões.
Este contexto de mudanças repentinas, que traz novos desafios aos gestores de Pessoas, pode ser o paraíso ou o inferno. Vários factores podem ser decisivos. Um é a potencial dificuldade de as organizações conseguirem mostrar que estão a procurar ser justas no relacionamento com os seus trabalhadores (nos casos em que, obviamente, estão a procurar ser justas), sendo que a percepção dos colaboradores de que existe injustiça é um factor altamente desmotivador e corrosivo nas organizações.
Outros factores incluem a reacção mais ou menos cooperativa dos colaboradores em geral às medidas da empresa, o foco no bem comum versus apenas o bem do próprio (por exemplo, o melhor para empresa em relação ao teletrabalho versus as preferências individuais de cada um em relação ao seu teletrabalho), a capacidade de reskilling e/ou upskilling dos actuais colaboradores, a reacção dos sindicatos, o papel das alterações legislativas.
As alturas de mudança mais forte podem ser, por vezes, muito positivas para as organizações, especialmente para as organizações mais resilientes. Os factores atrás referidos podem facilitar ou dificultar muito o trabalho da Direcção de Pessoas, para quem, não esqueçamos, está também a ser uma altura de muita aprendizagem, e ela própria poderá estar ou não preparada para este “novo mundo”. Tudo isto poderá tornar a Gestão de Pessoas em 2021 um paraíso ou um inferno.
Este artigo foi publicado na edição de Janeiro (nº. 121) da Human Resources, nas bancas.
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