A gripe

Opinião de Pedro Raposo

Director de RH do BES

Acredito sinceramente que o problema da improdutividade nacional não é um problema do País: é o problema do País.

E também acredito que não decorre das mais baixas qualificações da mão-de-obra, mas antes de uma questão “viral” que percorre a nossa sociedade.

Pretendo apenas levantar alguns sintomas desta “virose” de modo a que todos percebamos que este é de facto o nosso factor de “descompetitividade” internacional.

Sintoma 1: A perfeição

Para todos nós qualquer cenário que não seja, no mínimo, perfeito não serve. O simples caminho possível, prático e exequível, não faz parte no nosso vocabulário. Exemplo: é necessário

abrir um pequeno bar numa empresa para proporcionar um serviço de refeições simples e barato aos seus colaboradores, o que já agora aumentará a produtividade eliminando deslocações longe para poderem comer.

O que devia ser um projecto de custo baixo, e retorno rápido, transforma-se num inferno de Dante: há primeiro que mandar fazer estudos mundiais sobre bares em empresas de dimensão semelhante, há que alterar todo o sistema de exaustão no edifício para que os cheiros eventuais não afectem o bem-estar dos que não suportam comida, e mais milhares de estudos afins. No fim de quatro estudos de viabilidade, que já custaram três bares, chega-se à conclusão que nenhuma solução é perfeita (aliás o que já se sabe sempre, basta estar vivo) e simplesmente não se faz.

Sintoma 2: A “reunite”

A primeira reunião sobre qualquer assunto é sempre emocionante: simplesmente não se sabe ao que se vai! O simples hábito de agendar a hora início e a hora fim, a comunicação de uma agenda prévia dos pontos para cada um fazer trabalho de casa, não existem. O resultado é sempre nulo, pelo que na primeira reunião nunca vai ninguém com poder para fazer as coisas andarem e, como tal, dever- -se-ia designar por convívio. A plateia desta primeira reunião é sempre maravilhosa, porque permite descobrir colegas que nunca antes vimos, nem sabíamos que por cá andavam!

Na segunda reunião os motores começam finalmente a aquecer. Sim, porque chefe que é chefe, só vai a reuniões de chefes e nunca a reuniões de não chefes. O que é curioso é que, no nosso País, as reuniões de chefes são geralmente as últimas e, nos outros países, costumam ser as primeiras. A improdutividade deste ritual hierárquico e da falta de agendas, tempo de reunião, actas simples sobre o que foi decidido, transforma um processo fácil num processo que, além de improdutivo e lento, provoca imensas correcções por terem estado presentes inúmeros participantes sem qualquer nexo, transformando a comunicação entre eles num verdadeiro emaranhado de “diz que disse” e “julguei que”, até ao célebre” não sei porque estou aqui”, questão de profundo cariz filosófico e teológico.

Sintoma 3: A pontualidade

O problema da falta de pontualidade crónica é outra das mais graves falhas de todos nós. Se repararmos bem, em Portugal, ou se marcam reuniões para uma hora ou meias horas.

Desafio os leitores a provarem que já tiveram reuniões às 10h:15 ou às 15h:40. O que significa tal preceito? Significa que o tempo aceitável de espera em Portugal se situa na meia hora. Eis um povo tolerante! Façamos uma conta simples: meia hora vezes 6 pessoas são 3 horas a menos de trabalho. E 3 horas a menos vezes 50 reuniões por ano são 150 horas de trabalho a menos. É só continuar as contas. O que significa que os Portugueses são menos produtivos que os outros, muito simplesmente porque estão muitas horas sem fazer nada esperando pelos outros!

Sintoma 4: A urgência

Parece haver uma correlação de 100%, em Portugal, entre aquilo que é urgente nunca ser importante. A grande diferença entre estes dois conceitos que, no nosso País, são quase sempre confundidos, manifesta-se na arte da reclamação Portuguesa, que é quase sempre sobre o acessório e nunca sobre o principal.

Um dos exemplos mais interessantes deste fenómeno foi que se tivesse revisto por completo o Sistema de Segurança Social do País, sem qualquer manifestação de desagrado, algo importantíssimo para cada um de nós, tendo gasto muito mais tempo de antena e de discussão acesa na corrida Red Bull Douro ou Tejo, totalmente irrelevante.

Agora a grande pergunta? Será que isto é genético? Será contagioso? Tenho a certeza que não. Provas? O Português emigrante não anda nas auto-estradas alemãs a 160Km por hora, logo não é genético, mas antes induzido pelo comportamento dos outros. Apanha-se, pois, por estar em Portugal convivendo com portugueses.

Vacine-se, por favor!!!

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