A propósito deste dia 8 de Março

Há que ter coragem para assumir responsabilidades e exigir que, em pleno século XXI, não seja colocado em causa, muito menos desperdiçado, todo o potencial que mulheres e homens aportam para o progresso de pessoas e organizações à escala planetária.

 

Por Conceição Zagalo, vereadora da Câmara Municipal de Lisboa e membro fundador do GRACE, Grupo de Reflexão e Apoio à Cidadania Empresarial

 

Falar sobre as mulheres e o mundo do trabalho é um clássico. Ponto final. Muito se tem dito sobre o tema, muita tinta tem corrido, muitas opiniões, muita controvérsia, muitos estudos, muitas comparações, grandes dúvidas, certezas absolutas, números incontáveis, algumas conclusões, umas tantas medidas correctivas…  e a agenda continua.

Então porquê? Porque, quer gostemos quer não, independentemente do que se pensa, do que se escreve, do que se diz ou do que se defende, e pese embora a evolução sentida ao longo das últimas décadas, o papel da mulher no mercado de trabalho deriva do seu posicionamento na sociedade.  E, não há como escamotear, por muito que muitas mulheres o neguem e até façam questão de se afirmar como honrosas excepções ao comum dos mortais, a mulher continua a ter uma posição subalterna na maioria dos quadrantes sociais, económicos e até familiares.

A propósito do dia 8 de Março e das comemorações do Dia da Mulher, ano após ano, sou levada a dar mais uns passos na reflexão sobre as questões das oportunidades, dos pressupostos e dos factos reais, sobre o peso relativo de homens e mulheres na evolução da humanidade. E todos os anos dou comigo a concluir que, está bem, avançou-se um bocadinho aqui ou ali, mas, valha-nos Deus, é mesmo este o ritmo de evolução que pretendemos?

Não sendo esta uma questão de fácil abordagem, até pela forma como algumas das discussões são secundarizadas, há no entanto que ter coragem para assumir responsabilidades e exigir que, em pleno século XXI e na era da inovação, da criatividade e do desenvolvimento, não seja colocado em causa, muito menos desperdiçado, todo o potencial que mulheres e homens aportam para o progresso de pessoas e organizações à escala planetária.

Assim, se é sabido que o número de mulheres a saírem das universidades é crescente e superior ao dos homens, então porquê desperdiçar tamanho talento e deitar a perder toda uma miríade de oportunidades de que o mundo precisa para evoluir de forma mais harmoniosa, mais equilibrada, mais sustentável?!

Ao longo de toda uma carreira que reputo de muito bem-sucedida, transpus todo um sem número de barreiras rumo à afirmação profissional, à conquista de maiores responsabilidades, ao sucesso enquanto dirigente. Claro que nem sempre foi fácil gerir crescimento pessoal, profissional e familiar, não permitindo que nada nem ninguém pusesse em causa todo um capital de mérito e potencial de contribuição para o sucesso do todo. Tomei posições de força no sentido de fazer valer o meu posicionamento, também quando posto em perspectiva com o outro prato da balança, não me deixando contentar com o segundo lugar da fila, quando sabia que o número um estava lá para mim.

Mas foi sempre fácil? Consegui sempre os mesmos níveis de retribuição mesmo perante reconhecimento superior? Foram sempre inequívocos os critérios e as práticas de rigor e de justiça na avaliação do contributo para as organizações em que escolhi crescer? Nada disso. E desengano-me de cada vez que me sinto tentada a achar que tudo está muito melhor agora, que as dificuldades por mim enfrentadas são coisa do passado e que o equilíbrio no mundo do trabalho está aí para ficar.

Se dúvidas eu tivesse e, sublinho, mesmo sendo francamente maior o número “delas” saídas das academias, na hora de olhar para o topo das corporações, para o topo da política, dos governos, das forças armadas, das autoridades de segurança, das oportunidades, das remunerações, a paridade joga noutra divisão e são “eles” que mais alto chegam para aí se posicionarem de pedra e cal até que a sorte os abandone.

Talvez por isso eu tenha uma leitura muito própria sobre o tema das quotas, sobre a necessária complementaridade de visões em estruturas operacionais e executivas, sobre a responsabilidade de mulheres e homens na gestão familiar, sobre as questões biológicas e as leituras hemisféricas sobre o cérebro humano, sobre a valorização de inteligência racional e emocional em matéria de género, sobre o papel que a eles e a elas, ou seja, a ambos, cabe na hora de se afirmarem no mundo do trabalho.

E, independentemente das leituras mais científicas dos estudos que em Portugal e no mundo alegremente se vão fazendo sobre esta grande causa da mulher, e da mulher no mundo do trabalho, vamos lá mas é a pôr a mão na massa e a garantir que não desperdiçamos todo o talento e capacidades aportados pelos muitos milhões de mulheres por este nosso planeta espalhados.

Até porque, no dia em que os decisores deixarem que a economia de mercado se manifeste de forma espontânea e livre nos fóruns públicos e privados, entre outros, acredito que aí as mulheres marcarão, definitivamente, a agenda da evolução. Nesse dia, os debates distrativos sobre quotas ou não quotas deixam de ter sentido.

Em jeito de conclusão, apetece desejar que a propósito o dia 8 de Março e a cada ano que passa, possamos todos realizar que as coisas não estavam afinal tão desequilibradas assim.

Posto isto… Bom dia da Mulher!

 

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